11.2.03

FRIJOLADA

Na ressaca da Paloma fui encontrar-me com o Elenio, Argentino amigo do Allan Sieber e ex-editor da Lapiz Japones. Mora em Barcelona há alguns anos e ultimamente anda fazendo uns quadrinhos e projetos para crianças, alèm de produzir Flashes para Internet com coletaneas de trabalhos de outros artistas além de um trabalho documental seu de Stickers que ele anda colando nas sobresaturadas paredes de Barcelona e Amsterdam. O cara me levou pra conhecer umas lojas de quadrinhos de chorar e no caminho encontramos uns outros artistas amigos seus. Um arquiteto argentino chamado Dani nos levou pra mostrar o imóvil que ele tá recuperando pra transformar numa galeria, num prédio de 500 anos supostamente fundado por um marinheiro de Colombo. Rola uma loja chamada Freaks que ocupa todo um quarteirao vendendo quadrinhos, livros de fotografia e ilustracoes, parafernália Sci-fi... Essas coisas... É iteressante notar que enquanto nos Estados Unidos estes tipos de estabelecimentos parecem um supermercado na Europa elas parecem Boutiques. Dai tu já vê claramente a distinçao de industria cultural nestes picos. Finalmente terminamos o rolé em sua casa onde o Elenio cedeu quatro histórias para a Tarja Preta, em breve nas suas maos...

De noite me encontrei com a Raquel, a Raquel tem uma irma gemea, a Denise. Elas estudaram na mesma escola que eu um ano na minha frente e faziam parte do gremio. Na época eu já era anarquista com todo o radicalismo de um garoto novo e repudiavo o gremio que nao fazia muito mais que produzir duas festas por ano e uma gincana idiota além de editar um jornalizinho mediocre. Dai que eu nao me dava muito com essa galera. O colégio era interessante, situado no catete ele era um foco de todo tipo de gente, playboys do Lado A da zona sul, afrodescendentes da Lapa e da ZN, familias de espanhois donos de motéis e puteiros, filhos de artistas de Santa Tereza e a galera da pista, tao habituada a ir no circo voador como no Baile Funk do Santo Amaro, um bom lugar. Mais tarde quando sai de lá voltei a encontrar as gemeas na faculdade e pela nite. Ficamos, elas eram muito gente finas e assumiam que apesar de terem se divertido muito no gremio este nao prestava pra muita coisa mesmo. Dai eu me lembro de numa Maldita a Raquel dizer que ia pra Barcelona e eu dizer - Demoro! Qualquer dia te visito!!! Um ano depois ela volta casada só de passagem e eu repito pro casal - Qualquer dia visito vocês. Nao deu outra.

A Raquel tá sofrendo da sindrôme de imigrante no inverno, achando tudo e todos uma merda. Normal, a Europa é uma maravilha mas nao existe lugar como o Rio de Janeiro apesar de todas as balas perdidas. Resolvemos ir pulando de bar em bar atualizando todas as fofocas sobre o bonde do Rio de Janeiro e do bonde do Rio em Barcelona. É engraçado porque a gente se conhece a tantos anos, papo de ser pelo menos uma vez por semana na Maldita (elas eram do Humaitá, no limite de Botafogo Valley) mas nunca fomos muito chegados e nem tinhamos noçao como nossas vidas se cruzavam tanto. Sabe aquelas histórias que acabam envolvendo um monte de gente!??? Pois é... Numa coisa chegamos ao lugar comum, o Rio de Janeiro é uma putaria, os homens inteligentes sao poucos e disputados a tapa pelas mulheres tao vagabundas quanto bisseuxuais... o Rio de Janeiro é lindo... Nao é a toa que a gente tem aquela fama... Depois da primeira cerevja no Ruta dos Elefantes fomos parar no Fantástico que tocava Pop e Indie Inglês e tinha uma pista crowdeadissima. Quando o bar fechou resolvemos procurar um dos muitos bares clandestinos. E depois de perdernos na secular cidade finalmente chegamos no Poppov (ou algo parecido), uma adega medieval com uma pesada porta de madeira, senha pra entrar e o caralho! Pé direito baixo, fumaça no ar e gritaria. Só faltava o Frodo dançando descalço em cima da mesa. Nos sentamos do lado de uma mesa onde um grupo grande e exaltado começava a bater palmas e cantar enquanto as mulhers do grupo balançavam o quadril num sensual e espontâneo Flamenco. O Dono do bar aparece para lembrar que trata-se de um bar clandestino, já passou da hora e pessoas moram no andar de cima. A galera respondeu fazendo mais barulho e batucando no teto. Enquanto eu fumava haxixe feliz da vida notava o pessoal das mesas quabrando garrafas vazias contra a parede e esticando uma carreira de cocaína (bah! cocaína! vai saber o que tem nesse bicarbonato) na mesa. Enquanto a cocaína é tolerada e seu autocultivo legalizado a cocaína nao. No entanto aqui ainda é bonito cheirar, enquanto no Brasil o pó puro e forte é absolutamente decadente aqui é chique... vai saber...

Um momento na fila do banheiro o cara atras de mim começa a falar em Catalan. Eu nao entendo nada e digo isso em espanhol... Num espanhol muito tosco e bebado ele pergunta de onde eu sou

- Pues, de Rio de Janeiro hombre!!!
- Oye tio! Si me voy a Rio de Janeiro voy a la playa y ahi empiezo...

Fez um gesto com o punho fechado, subindo e descendo a mao e falando um termo chulo em Catalan. Nao entendi porra nenhuma...

- Y Que? Vas a fumar um porro en la playa!?
- No tio... Voy a...

Colocou o punho cerrado sobre a calça e repetiu o movimento de vai e vem.

- Ah! Si! Te vas a buscar una mujer y...
- No hombre! Bueno! Si me da bola una brasileña si... pero... voy hazerlo solo!
- Ah! Si! AMOR PROPRIO!!!!
- Eso mismo!!!

Nisso a galera que tava na fila atras dele começa a protestar!

- HEEE HOMBRE! NO LO VAS HACER AQUI QUE ME MEO ENCIMA!!!!

Dai quando eu voltei do banheiro e tava geral bebum veio esse cara que tava falando com a Raquel falar comigo.

- Tu eres de Brasil no!?
- Haz visto a Ciudad de Dios!???
- Si! Como no!? Lo he visto en la Premiere! Con los directores y actores!!!
- Conozes a Ze Pequeno!???
- Pero Claro!!! DADINHO É O CARALHO! MEU NOME AGORA É ZÉ PEQUENO PORRA!!!

Rimos... O cara elogiava o filme, que achava muito bem feito... Fotografia, direçao e atuaçao da galera. Disse que tratavam-se de gente da favela. Expliquei o Nós do Morro...

- Y di-me! Pero esta exagerada la pelicula no!?
- No hombre... essa pelicula es sobre lo que ha passado ha veinte años... Hoy en dia es mucho peor...
- Ya has ido a la favela!?
- Y si... Y visto nenes de diez años empunhando Kalashnikovs...
- Esperate que voy a llamar mi amigo que deso entiende.

O cara era do país Basco e apesar d apinta de bom rapaz tinha um olhar bastante insano.

- Y que armas tienen!?
- El Kalashnikov, Uzis, G3, SigSauer, muchas pistolas Desert Eagle, granadas... pero la favorita es el AR15, una copia barata del M16...
- Si! De repeticion no!??? Sabes ahi en Pais basco cayo uno hoy!!!
- Un espanhol ou Basco!?
- Heee tio! Pues que ahi solo mueren los espanholes... Un policia...
- Bueno! Si es policia ya no hace falta...

Rimos... Rimos... Rimos...

Quando o bar estava já pra fechar, apertei o Haxixe da Paloma, enquanto eu tou no balcao apertando cola ese Moçambicano muito bebado do meu lado.

- Oye! Maryjuana! Vendeme Maryjuana!?

O Cara falava isso no meu ouvido, encostado em mim. A primeira coisa que fiz foi me afastar e chegar meu bolso. Tem muito pickpocket aqui. O cara reagiu!

- No! No! No! No soy deso!! Quiero Maryjuana...
- Me quieres vender? No Gracias! Ya tengo!!!
- No!!!! tu me lo vendes a mi!!!
- No hombre! No hago eso!!!
- Toma Diez Euros - disse esticando a nota surrada... porra! agora eu tenho pinta de traficante!? Vai ver é o bigodinho Cantinflas que tá foda...
- No hombre!!! No hago eso! Perdonadme...

Eu ficaria pra fumar com o cara, mas a Raquel sugeriu que a gente fumasse pela rua, porque já tava nascendo o sol. Dai o cara segue a genet até a porta...

- Dejem-me fumar... Dejem-me fumar... Viendam-me...

Vida Loka...
Temrinamos a nite sentados num banco da Rambla, esperando o metro abrir pra Raquel voltar pra casa. Um Pakistan aparecendo a cada cinco minutos querendo vendernos latinhas de cerveja por um euro...
Eu gosto daqui...

No dia seguinte rolou uma Feijoada na casa da Raquel, na presença do seu marido, uma Portuguesa supersimpatica e o casal de Mexicanos que moram com ela. Bebemos cerveja, vinhos de toda parte da Espanha e é claro cachaça. Apertei uma bomba de mato holandês e nao me lembro direito como terminou a parada (que foi das 14 as 24h!)...
Vida Loka...
Eu gosto daqui...

Nenhum comentário: