21.12.02

LIVING LA VIDA LOKA
O TERROR DEL VALLEY


“Se a chapa esquenta o milho pipoca”


Ela tava toda gatinha com seu vestidinho Brutal Crew customizado. O Ênio e o Cézar fizeram a fita toda, comprar tecido, pressionar as costureiras, trazer as máquinas de silk da ilha e pintar a porra toda na fundição. Quel e Sonic se amarraram, compraram a camiseta que virou vestido, eu tava lá, colocando o som na colisão, na última quinta o bagulho nâo era da mangueira mas o barato foi louco. O Molúsculos que ia tocar não pintou, mas mandou estes garotos punks no lugar. Foi massa, aquele som oscilando entre o tosco-sp e as vibes mais pélas da califórnia, o cara de jacko pintado e calça jeans justa e rasgada, a Sonic mandou logo entregar um bilhete dizendo algo como “que bundinha linda”. Ela escreveu com uma tipografia de charpi, e quando entregaram pro cara ele ficou tão bolado que pensou logo “é alguém de sacanagem”, eu sabia tinha que ser um tipo mais menininha, vai vendo…

Já me mandaram e-mail perguntando sobre os dreads e disse assim, o primeiro passo pra ter um dread é querer um dread. Não é a toa que o nome é aterrorizador desse jeito. Se você supera essa fase, de querer e aceitar teu dread, o que inclui a piadinha do teu porteiro ao mau-olhado da polícia cê tá no caminho... Mas arrebenta, e é mais que visual é estilo, é sobrevivência, porque enfim tudo parte disso. Mas sacudiu e babou, entrei no banheiro, catei a tesourinha de unha e foi… Filha a puta nenhum toca na minha cabeça, é nóis. Picotei mas dei mole, tirei muito da frente. Tô com mó cara de mané, tipo aqueles manés daquelas bandas de NY que fazem o tal do som Neo-New Wave, mas é isso, de camisa florida e penteado pra trás dá até pra posar de maldito e tocar o terror, garoto é foda!

Pergunte a Sansão quem foi Dalila? O Bon Vivant jamais mostra o ponto fraco… Atitude supera qualquer visual ou marra. Tive em sampa outro dia e vou te dizer, lá de cima, do avião, quando ele decola do Santos Dumont e faz a curva no pão de açucar, ou quando ele volta pela restinga, invade a ZN, sobrevoaa todos os morros e faz a curva em Niterói, mostrando de longe todos os monumtneos naturais e franceses do rio… É foda… Minha Sul, meu Valley, é tipo uma jóia rara, quando tá sentido-SP e faz a curva no bondinho é foda, tu confere a imensidão da ZN e a baixada e a pérola que é a sul, espremida entre corredores de morros verde-e-cinzas, a praia amarela, prédios brancos e uma lagoa do caralho. Vovô disse que nos anos 50 os postes de iluminação de Copacabana eram redondas, e denoite, do avião parecia que tinha um colar de perólas abraçando a famosa praia. Isso na época em que o Jorginho Falido Guinle comia a Marylin Monroe, hoje o hotel é da família daquele tiozinho que comia (e morreu com) a Lady Di. A vista de cima choca qualquer um, duvido que filha da puta algum tenha coragem de um dia cagar Tomahawk por aqui, mas vai vendo em gringo fanático e milico não se pode confiar jamais. Retroceder jamais.

A Colisão é o que há, o Kachanga é um puta pico underground, fudido e fudido, e a agressividade do Punk é que nem o Rap, é compromisso, e não tem competição, só jam, sempre jam, a cozinha segura uma base, a guitarra viaja, o DJ arranha o disco e os MCs improvisam. Nesta última Colisão teve até uns playboys, identificados como “Barões da Sul” ou qualquer palhaçada semelhante, que pediram pra rimar, subiram ao palco e ficaram cantando MV Bill, o bonde do Esquadrão ZN que tava tocando nesse dia filhou pilhando, fingindo tar gostando e mandando POW POW POW que tu sabe pra que que é. Gargalhada geral… Teve um momento em que o Babão ficou espancando a batera enquanto eu virava minhas bases de Reggae e Dancehall fazendo aqueles Scracthes sem vergonhas em cima do Rock The Funky beat do Urban Takeover da maravilhosa Natasha, Black Brit e carinhosa… Histórias de Manaus… o Aori mandando os Ragga emcima de tudo… Esse Inumanos promete… Vamos dando mais maconha pro garoto!

De onde veio os Diamante? Socar o espelho do buraco até machucar a mão, querer cortar as veias mas nunca tocar numa lâmina, desesperar-se e querer morrer. Quando eu ainda cruzava com esse tipo de gente eu catava essa mina, notória safada da internet, de pele muito branca, olho muito azul e cabelo muito loiro. Como era gótica tingia o pelo de preto, a primeira vez que conferi ela assim me choquei. “Inteligência Artificial” respondeu a cachorra bem-humorada. O pentelho ainda era loiro. Dava carona pra ela, que morava na beira de uma das encostas do Valley. A rua era tranquila entã sempre rolava uma sacagame no carro, foda-se quem a gente tava "namorando" na época, e como ela patolava, e eu respondi a altura, ela sempre usava saia… Quando cansei da patolagem e mostrei o palhaço ela retrocedeu… se assustou… fala sério! Retroceder jamais… mas pra ela era só patolagem e ainda assim só com tecido… Fala sério! Depois fica mandando ICQ e E-mail sacana… vadia…

Faltando duas horas pra eu ir pro aeroporto uma outra maluca fica me ligando desesperada pra me ver. Ela tava há alguns meses sem sequere olhar pra minha cara na balada, mas como me viu de manhã em copacabana imaginou logo que eu tinha comido alguém por lá e ficou com ciúmes e tesão e tentou me ligar o dia todo... desculpa baby, agora não dá, agora tá muito emcima, agora só ano que vem...

O novo som do Racionais detona. Eu nunca me amarrei muito no som deles por duas questões, ou melhor três, achava que eles pagavam muito pau de gringo, achava as bases fracas e não suportava aqueles discurso crente que meteu a cruz na capa de “Sobrevivendo no Inferno”. Fala sério cristo chegou da Ibéria matando os vermelhos e escravizando os pretos… Que papo é esse? Mas “Fim de semana no Parque” e “Diário de um Detento” valem toda a obra… Agora tá aí o “Nada como um dia após outro dia”, lema que eu sempre estampei mas como “Nada como um dia após o outro…” pode conferir no django muitas vezes… As bases são do Zé Gonzales e o Ganja, o tal do Instituto. Eles são foda né? São paulistas mas foram criados no PLANET HEMP né? Tá ligado, o barato é louco, o Rio é nosso Oeste Selvagem. Eles já tinham feito um puta trabalho com o Sabotage, agora no Racionais as bases são muito fodas. Foi uma PUTARIA, uma SACANAGEM eles não terem dado o prêmio de melhor produtor pro Zé… Eu tava lá, do lado dele, certo que era ele, porra o cara produziu como Ganja o Sabotage e o Racionais, justamente os caras que levaram todos os prêmios da noite. Ele fechou os olhos na hora… E quem ganhou foi o KL Jay. Porra! Ele mesmo ficou bolado, ele não produziu disco algum este ano!!!! Ele ficou feliz com o prêmio merecido de melhor DJ, mas porra!!! Melhor produtor? O cara não produziu porra nenhuma… O prêmio é do Zé e do Ganja, que detonam nessas bases…

Quem mandou bem no Hutus foi o Jair Rodrigues, que disse que o Hebert Vianna fez uma pesquisa pra saber qual foi o primeiro Rap. A primeira rima escrita sobre o ritmo, e pra nossa surpresa não era "The Revolution Will Not Be Televisioned" do mano Scott-Heron e sim "Que digam, que pensem, que falem..." Conclusão" O Rap é tão nosso quanto o samba e por isso não podemos e não devemos pagar pau de gringo algum. Explica isso pros manos! Tem cada um... Tu vai rimar ou tu vai malhar porra!?

O Racionais também evoluiu tremendamente, este disco novo é bem nervoso, CD duplo “Chora Agora” e “Ri depois”, clicks estilo low-rider e preço dugerido e respeitado de 23,90 estampado na capa. Porra! Perto do que neguinho mete por aí até que tá de bom tamanho, não dá nem vontade de comprar o pirata pra não perder aquela foto em que o Brown tá seguido de uma pá de moleque, e os carros também… Ontem a noite numa festa Toska um amigo me disse que o CD do “Tribalistas” é mais caro que os outros porque têm um tal de faixa anti-pirataria. Quado alguma vadia levou o CD pro escritório dele, ele fez questão de meter no computador e fazer uma cópia… Faixa anti-pirataria é o caralho… Alias que porra é essa de tribalistas? Mó tralálá do caralho… O Arnaldo Antunes era um cara maneiro… “Tudo ao mesmo tempo agora”, “O Nome” e “Ninguém” são geniais, “O Silêncio” tem sons fodas mas começou a farofar, que ele escreva pro Carlinhos Brown e a marisa Monte tudo OK… Dinheiro é assim… Agroa chamar esses caras pro disco???? Gravar um disco depois? Puta que pariu… é só ladeira abaixo… mas tudo bem, junto da foto da BJÖRK, as fotos do Arnaldo são as que fazem mais sucesso entre as minas inteligentes. Ok, ele farofou pra pegar mais mulher. Mulher inteligente e de óculos (ou lente)… Deixa ele!

Depois de vários copos d’água resolvi colocar os dedos na boca e vomitar. Caralho, foi assim que senti o gosto de limão, açucar e alcóol… Isso… Tava na cervejinha a noite toda, entrei nessa caipirinha e me fudi… por isso dormi fedido na produtora… tá ficando foda… Mas o barato tava louco, um Catarina lá tava metendo uns EMINEM no som e se bolou quando eu invadi e coloquei o Racionais… “Eu gravei esse CD pra festa!” Foda-se eu tinha o aval do Allan… Que quer mesmo é ver o circo pegar fogo… Como eu fui parar naquela cama? Ai que merda… Tinha uma coroa me dando mole?? Acho que não... deve ser coisa da minha imaginação... Delirium Tremilins... é assim que escreve? Eu acho… Tá foda, eu achei que tudo ia acalmar com meu corte de cabelo mas que nada… já falei vou repetir – elas estão descontroladas… AH! Tinha um moleque tocando violão pra caralho!

Violão é foda! Me lembra inevitavelmente o Uruguay, onde minha ninfeta revezava milongas com reggaes, rock argentino e farofagens brasileiras. O Uruguay é meio atrasado nuns aspectos, mas é fudido em outros, e a ninfeta é minha irmã de tattoo… Eu preciso de mais Tattoos… Meu Pai também tocava violão, eu ainda tenho esse violão, com um burcao embaixo, do dia em que Mamy deu com ele na minha cuca… vai vendo…

Quando nossa Benedita pintou no palco pra apresentar a “melhor banda” foi aplaudida frenéticamente. O Lula é o cara mais votado da histórtia nénão? Ela disse que tava boladona de ir no prêmio achando que os rappers iam aterrolizá-la. Quando o Racionais foi buscar o prêmio com uns cinquenta manos o Ice Blue mandou logo – Eu sempre quiz que minha mão fosse uma rainha preta! Táqui a rainha preta!!!

No show o Mano Brown explicou que antigamente, nos bailes neguinho dançava. Mas não era rebolado, era passo vagabundo… Recrutou quem tava na dispô de fazer esses passo pro palco… Mas não podia subir com camiseta Bad Boy… Por que isso é papo de polícia! E neguinho jogava a camiseta fora…

E pensar que eu já fui escravo. Me matando numa porra de escritório por um salário yuppie! Criando e ralando pra um bando de executivucuzinho de merda! Gente que levanta o vidro pros menó malabaristas do sinal. Qualquer dia tá velado, e de caixão fechado! Fala sério cumpadí, Fala sério!!!

6.12.02

ESTAÇÃO PRIMEIRA
Voltando de um animadissímo rolé pelo Maracanã, avisto um carinha de camisapreta acompanhado de uma mina agradável, derepente o cara me encara e eu penso que é por causa da mina, mas não, ele pergunta se eu sou um colaborador. Informante? X9? Viracasaca? Que nada, ele queria saber se eu era colaborador do Cucaracha Zine, visto que tava com uma das poucas camisetas do cucaracha que ainda existem por aí...

- Errrr... Eu é que faço! - respondi em processo lento
- Porra! Que do caralho!!!

Iamos em sentidos opostos e um trem acabara de chegar. Cortamos por aí.

É bacana esse tipo de contato. Mais bacana é ter conhecido tanta gente maravilhosa mais ou menos assim. Este planeta é uma tigela com alguns ovos!

Tinha de me arrumar pra sair mas fiquei aproveitando o veneno e lendo um bando de coisa antiga... coisa que escrevi há dois ou três anos... algumas resenhas, mas principalmente os textos do djangobroder... muita coisa inspirada pelo ácido, numa insegura época de abusos...

muita coisa acontece!
estou atrasado...


29.11.02

BICHO SOLTO


Outubro, num boca livre no centro da cidade:

- Porra!!! O Filme tá bombando né!? Lá for a e o caralho…
- É mas aê é só Meirelles… Meirelles…
(…)
- Nesse bonde do cinema tem muito filho da puta! Cê já assistiu “Pixote”? Tem que se ligar hein!?
- Deus me livre bicho…

Dai uma das cabeças do evento chega pra mim (e só pra mim) e diz:

- Você não pode fazer isso!!! A direção toda da BR tá aqui!!!
- Bah! Se eles queimam petróleo porque eu não posso queimar maconha!?



Intervenções urbanas, instalações e galerias… A vida dá muitas voltas, ninguém me avisou que aquele cara que tava clicando o Seu Jorge (com a camiseta do greenpeace) era o Vik Muniz, aquele fotógrafo que faz retratos de açucar, macarrão e afins e teve presente na maioria das conversas sobre arte contemporânea que tive recentemente com amigas universitárias e artistas plásticas. Sempre tem o suficiente por perto pra encher uma sala de aula. Bem, ao que parece o Vik cruzou com o Seu Jorge no Baixo Gávea e convidou-o para fazer uma sessão de fotos, vai ver ele o achou parecido com o cara que faz o “bandido do bem” em CDD. Ninguém me avisou que era o cara, portanto a única comunicação que rolou foi mais ou menos assim.

- Maneiro!!! Você também usa Nikon!!!

Papo de três semanas atrás depois de fazer umas filmagens pro documentário da Toscographics “Quebrando tudo” sobre o Hermeto Paschoal eu e o Aori acabamos num desses happy hours do centro conhecendo a Angel, gatinha e fã do Planet Hemp. Como o Planet ia se apresentar na barra naqueles dias decidimos armar com a mina um “dia de princesa”, no esquema daqueles quadros bregas que passam na TV aos Domingos. Iamos pegar uma van no Brooklyn, digo, no Catete com o pessoal da banda e ir direto pro camarim, encher a cara e cabeça e assistir tudo do palco. Pimpin’n’Playin’. Acontece que por problemas de comunicação e sequelas não consegui achar a mina, nos atrasamos e acabamos perdendo a van. Como não estávamos afim de encarar uma viagem de ônibus sentido Zona Oeste pra nos acovelarmos com milhares de pitboys emaconhados decidimos ficar pela Lapa. Foi quando cruzamos com essas duas gatinhas:

- Tamos indo ver a Tati Quebra Barraco lá na Mineira!!!

Eu já tinha visto um show da Tati quando trabalhei nas filmagens do “Febre de Funk”, mas era matinê e num clube do asfalto, longe de qualquer baile funk de comunidade. O morro da mineira fica lá pelos lados do Catumbi e fez notícia ano passado, quando declarou guerra contra o morro da Coroa e transformou a tijuca numa praça de guerra com toque de recolher e o caralho. Já tinha ouvido várias histórias de perrengues nas idas ou voltas desse baile, mas quem as contávam eram um ou outro idiota do meu prédio metido a bandido. E se tem uma coisa que neguinho não respeita é playboy metido a bandido. Com viciado é diferente, viciado banca o babado né!? Então topei na hora invadir o baile.

Chegando lá, dava pra entender porque esse morro tinha causado tanto problema, só rola uma entrada ou saída que te leva até uma espécie de vale, rodeado pela favela. Nos primeiros metros de subida já dava pra avistar alguns soldados de touca ninja e pistolas cromadas bradando “bota a cara Mister M!!!” pra massa de pessoas e motocicletas que subia o morro. No tal do vale, uma quadra ocupada por um Sound System maravilhoso. Um paredão da Equipe Big Mix, disparadamente melhor do que o som de qualquer boate ou casa de show que eu já visitei no rio ou em são paulo! Volume, equalização e graves perfeitos. E que grave… todas as nossas cartilagens e músculos tremiam junto com a batida do baixo. Gratis e open-air, rodeado por pessoas dançando frenéticamente ou circulando em “bondes”, cada um com sua coreografia bizarra. Do caralho, a certeza de que a Jamaica fica por aqui mesmo só que sem Reggae ou Dub, só Gun Talk.

No rio de Janeiro, o funk é o som das ruas, existem algumas rádios especializadas, coletâneas picaretas em lojas de discos ou camelôs e até um programa de televisão. Mas você não precisa tar sintonizado em nada disso pra conhecer o funk, você não pode fugir dele, o funk invade seu território de qualquer maneira, seja no último volume do som de um carro fudido circulando pelas ruas, nos gritos das torcidas organizadas, ou no assovio de um officeboy na fila do banco. É na comunidade, em frente ao paredão que tu vê que o bagulho é muito mais sério do que os modismos que pintam por aí. MCs chegam a fazer quatro apresentações por noite, o som é fenomenal, e a todo momento você acha que com uma câmera conseguiria o prêmio Esso de jornalismo, ou uma roupa de fita crepe. Porque será que os porcos são tão gordos por aqui!?

A Tati tava numa dessas neuroses de vários shows numa noite e tava atrasada, um MC subiu ao palco, disse que tinha acabado de falar com ela pelo celular. Ela tava na Baixada mas prometeu aparecer pra dar o show, até lá quem animaria o baile seria o MC G3 estilo proibidão. O Mosca tinha me arrumado um CD com os “28 melhores do proibidão” que ele tinha descolado na area dele, não dá pra arrumar esses nos camelôs porque a polícia encrenca, mas a internet tá cheio deles. Eu me lembro que a gente ficou viciado no gênero, a medida em que o Mosca trzduzia as girías e eu ria pra caralho. Quando a gente foi lá pra Bahia juntos toda vez que algum trafica ou malandro tentava acharcar avisávamos – Se liga! A gente é do rio! Lá o comando tem até trilha sonora!!!

Os sons que o MC G3 eram versões atualizadas dos clássicos do proibidão, as mesmas bases com atabaques de sempre, os samplers de rajadas e as mesmas melodias copiadas de músiquinhas pop, mas com letras atualizadas e novas intervenções. Antes de cada música, rolava um sampler de locução de rádio ou televisão, contando algum episódio recente da guerra de fações do tráfico, ficava mais ou menos assim.

William Booner: Comerciantes de todo o Rio de Janeiro fecharam as portas por imposição de traficantes do comando vermelho.

[samplers de rajadas, começa a batida]

MC G3: Quem mandou fechar!!! FOI O PODER PARALELO!!!!

Os sons ficavam cada vez melhores.

“Beira Mar Falou
Osama Sou eu!
O Celsinho morreu!
E o Uê se fudeu!!!”

“26 de Outubro! Eu fui votar! Pra governador! Fernandinho Beira-Mar!”

Baile Funk é o mó respeito, não tem essas coisas de boate de playboy onde um bêbado fortão empurra alguém ou tenta agarrar uma mina a força e abre precedentes pra uma porradaria. É super tranquilo. Essas merdas de Lado B e Lado A que você vê na televisão é só em alguns bailes onde a galera só vai pra isso. Quando rola alguma merda, é porque alguém tava envolvido em alguma merda… Ou bala perdida né? Portanto a gente tava lá seguros e animadões, secando as popozudas e nos divertindo quando vimos aquele bonde de vários “menores de 1,20m” abrirem caminho empurrando todo mundo. Quando um deles passou perto é que eu percebi o AK-47 com labaredas de fogo grafitadas na lateral, tratava-se de uma AK Hot-Rod!!!

No decorrer da noite, vimos Aks camufladas, vários outros fuzis e várias pistolas, todas empunhadas por menores neuróticos. Não que eles sejam os únicos bandidos da favela, acontece que são os únicos kamikaze o suficiente para ficar mostrando a cara pra qualquer idiota que quizer ver. Num determinado momento um menorzinho de uns dez anos com um AK maior que ele, todo remendado com Silver Tape subiu no palco e ficou dançando. Logo mais ele pegou o microfone e ficou mandando mensagens que iam desde saudações pra “galera da escola e da creche!” até ameaças pros canas que moram na favela. É nesses momentos que a gente olhava um pro outro e lembrava de todos os clipes e filmes que viu com o Snoop Doggy Dog e o Dr. DRE e começava a rir. Caralho! Quantos minutos cada um daqueles negões cheio de ouro e marra iam durar por aqui!?

- Na escolinha já tá todo mundo formando!

Dai o Racionais dá uma entrevista exclusica do YO! Cês lembram daquele quadro da MAD? Respostas cretinas para perguntas imbecis. Pois é, o Rapping Hood pergunta pro Racionais.

- Diz aê truta! Qual o conselho ’docês pra quem tá começando?

E o Mano Brown:

- Não tem essa de conselho não!!! Se ficá de pioiágem e dé milho! É PAU NO GATO!

Essas palavras de sabedoria ilustraram a viagem relâmpago que faríamos semanas mais tarde a SampaCity, mas antes de volta à mineira. Na favela o que mais têm é boteco e sinuca, um atrás do outro. ONG e rádio comunitária também sempre tem, mas só presta quando não tá na mão dos crentes. Os crentes são sinistros, construiram uma porra duma igreja dessas debaixo do meu prédio. Outro dia eu tava parado na rua esperando uma carona pra um trampo da toscographics quando percebi aquele mulão de gente rezando levantando envelopinhos brancos. Fiquei pensando se tratava-se de dinheiro, e não deu outra, o comédia que trabalha na barraquinha de cachorro quente me mostrou um desses envelopes onde lê-se mais ou menos o seguinte:

COTA DE MANÁ – “A caminho da terra prometida”
Obs.: Em caso de cheque cruzar e colocar nominal a igreja.

Depois disso fiquei sabendo que outras igrejas mais profissionais têm envelopes de cores diferente dependendo do valor do salário correspondente ao dízimo e que isso (e questões como errr… indadimplência com o senhor) o lugar onde as pessoas se sentam é diferenciado. Puta que pariu, e tem neguinho que perde tempo dizendo que maconha faz mal. Que eu é que tou errado! Este mundo tá perdido mermo…

Voltamos pra casa de manhã, o 410 parou no ponto e abriu a porta da frente direto, ninguém pagou. O chapa é o Chapa!
***

Finalmente lançamos o clipe de “MONSTROS L.A.P.A.”, mega-produção onde levei ao limite minha escola Gonzo-Dogma 1,99. A festa e primeira exibição pública rolou dia 24 na festa Miami-Rio no Ball Ruim, o público lotou a casa e se acotovelou pra ver o clipe rolando no telão. Foi bem maneiro ver reações e ouvir comentários.

- Caralho! Que tosco!
- Caralho! Parece filme do Zé do Caixão!
- Caralho! Quanta gostosa!!!

Empolgados pelo desempenho do vídeo de “Ontem eu Sambei” do Wado, resolvemos fazer um clipe que não seguisse exatamente a estética corrente dos clipes de hip-hop, sobretudo nacionais, aquelas coisas de neguinho falando com a mão, favelas, câmeras em 30 graus, armas, mãos, mãos, mãos…. Até porque o Inumanos é um grupo de rap que têm uma temática bem mais abrangente que essa. No final das contas não teve saída pra filmar onde não tenha rolado algum problema, por sequela da produção ou subversão.

Qual foi a felicidade quando filnalmente levamos o clipe pra MTV no dia 26 e em 10 segundos de clipe o Caio, o responsável por receber os clipes diz:

- Porra! Maneiro que não parece esses clipe de hip hop!!!

O cara ficou animadissímo e disse que o clipe vai estréiar no YO! mas que vai colocá-lo em outros lugares da programação. Ele passou o clipe várias vezes na apertada sala cheia e gente entrando, saído e dando seus comentários. O Chorão (esse mesmo que você tá pensando) ficou amarradão e perguntou da onde a gente era

- Lapa!
- Hehehehehe… Lá só tem cachaceiro!!!

O João Gordo também tava na sala, só que de costas, uma pena, senão ele teria reconhecido o Heron, que no último show que o Uzômi abriu pro RDP surrupiou o fudêncio, que por sinal aparece no video clipe. O Heron já trabalhou na banca de jornal a mãe do Aori, eles se conhecem desde moleques, já estudaram na mesma sala e fizeram milhares de filmes trash dirigidos pelo Heron com muita groselha e ossadas de boi descoladas no açougue. Os inimigos eram sempre invisíveis, espíritos ou vírus devoradores de carne, uma beleza. Pro clipe resolvemos fazer um filme de terror e chaamos o Heron pra ser o monstro e diretor de efeitos especiais. Inventamos dezenas de mortes e recrutamos um monte de amigo, no final não filmamos nem a metade do que planejamos mas tinhamos material pra fazer uns quatro clipes. A intenção inicial era colocar o mínimo possivel de Babão e Aori no clipe, mas mesmo assim resolvemos começar as filmagens gravando os caras rimando nas ruas usando umas túnicas, mó micão!

Os Inumanos mais o Ênio, que faz o papel do detetive e é o assistente de produção (e cara que tenta agendar as paradas e arrumar os lances pras filmagens) do babado desfilaram com as túnicas pelas ruas da lapa e o centro da cidade, em pleno meio-dia claro. Carregavam meu toca-fitas guerreiro, uma lança zulu de dois metros (“lembrancinha da Africa” que meu avô me descolou!) e uma placa escrito INUMANOS. Os comentários dos transnuentes eram peculiares:

- PU-TA QUE PA-RIU!
- Mas que palhaçada…
- Meu Deus! Onde este mundo vai parar???

Estávamos pagando mico perto de um ponto de ônibus lá na Avenida Chile quando um crew de B-Boys nos avistou, dissemos que estávamos gravando o clipe dos Inumanos e eles nem hesitaram em começar a mandar moinhos de vento lá mesmo, na calçada, em pleno centro da cidade. Eu me pergunto se essas coisas acontecem em Sampa ou NY… Valeu É NÓIS CREW de Santa Cruz – ZO pela participação no video… Em seguida ficamos sabendo que tava rolando um evento de Rap na estação de metrô da carioca, invadimos a situação e gravei um frestyle do Aori naquele palco, e o Babão tocando junto do DJ que tava lá (não lembro o nome mas o cara era bem bom!). Também filamos umas quentinhas no camarim improvisado e ralamos o peito quando ficamos informado que logo mais um pessoal de uma ONG com mó papo de evangélico ia assumir o evento. Pagamos nosso mico final na Uruguaiana e no Largo da Carioca e suspendemos as filmagens do dia, já era tarde, o Aori tinha que buscar a irmãzinha no colégio e eu tava afim de ir ver uma cabine no Odeon.

***
Ah sim! Para compreender melhor as filmagens de “Monstros L.A.P.A.” é preciso compreender a época em que ela rolou, nos meses se setembro e outubro de 2002. Setembro sempre é um mês clássico, e mês de festival de cinema, é quando a cidade começa a ficar quente, o ano tá acabando e o que o povo quer é trepar e se acabar. É a época em que ninguém mais aguenta ficar em casa e vai pra rua interagir, conspirar e fazer dinheiro. Neste ano foi uma época especialmente conturbada por conta de uma das eleições mais disputadas de nossa história e uma série de eventos tão surpreendentes quanto lastimáveis no rio de janeiro. Uma época onde sobre tudo “elas estão descontroladas”.

Numa grande metrópole tem de tudo, até barão do petróleo. Transborda investimento, bocada e desigualdade, mas se tu é malandro come pelas beiradas legal. Setembro sempre é o mês das bocadas, com o Festival do Rio por aí, começam a rolar as premieres e festinhas, daí vem o festival com aquele bafafá todo que sempre culmina numa festa de encerramento no Odeon sempre muito divertida graças ao alto insumo de destilados, fermentados e baforados.

No CMI de Nova Iorque eles tem um cartaz que diz assim – O que você quer comer hoje!? Sushi!? Pizza? Massa? Carne… Do lado da opção desejada tem o endereço dos restaurantes e o horário que eles jogam fora o desperdício devidamente empacotado em quentinhas à disposição da galera. Sempre dá pra comer pelas beiradas se você tem o contato certo. Quem tá devagar sempre pode ir pro nove, onde sempre dá pra se divertir apesar daqueles tranceiros idiotas que pousam de neo-hippies e sujam a porra da praia com suas embalagens de GuaraPlus e afins. Eu pelo menos cago pra essa porra de saúde e bebo cerveja, e a cada dez minutos tem alguém perguntando se eu já acabei pra levar minha lata pra reciclar. Outro dia fui encontrar com minhas amigas modelos na praia levando o meu fiel radinho toca-fitas mono dos anos oitenta. Cheguei ouvindo Sabotage com o Aori e até o fim do dia reunimos inúmeros DJs, MCs e afins de todo o rio por ali, os pit-boys e aquelas meninas de família que têm até endereço fixo só não nos olhavam como um bando de “paraíba favelado” porque a Diana Bouth tava com a gente amarradona. As vezes eu acho que não são eles, mas eu que moro no planeta errado. Mas que nada… Nada disso…

O Festival de Cinema é engraçado, todo ano rolam cerca de quatrocentos filmes e tu vê gente pra caralho, gente que tu só vê nessa época do ano, se esbofeteando pra esgotar as salas de meia dúzia de filmes. Dependendo do filme que tu vai ver é mó pala de desfile ou confraternização de amigos (se tu tá indo num daqueles midnight movies). Legal mesmo são as cabines de imprensa, que começam umas semanas antes do festival e prosseguem durante este pelas manhãs. É divertido, tu vê uns quatro filmes seguidos de graça e fica comentando com os amigos nos intervalos e bolinando as amigas nas projeções. Nesta época do ano o clima começa a ficar inspuortávelmente quente, as teclas do meu mac ficam todas meladas e ninguém aguenta ficar sóbrio ou dentro de casa. As pessoas ficam malucas e as coisas acontecem, grandes negócios e grandes putarias floreiam o verão. Ah! Que bom que aquele frio filho da puta acabou!

As cabines abriram com “Spider” do Cronenberg, geral babou ovo mas eu e o Remier que estávamos esperando aquelas paradas Gore de antigamente ficamos meio decepcionados. Tudo bem que o ator manda muito bem e a direção é asfixiante… Taí… acho que foi isso… o filme sufoca legal, é pesadão, chato… Nos dias seguintes vimos uma série de filmes Latinos, a maioria do Chile e da Argentina, onde predomina o cinema-pilantragem. É impressionante, mas o anti-herói é o herói deste hemisfério mesmo. A descrença nos sistemas vigentes é unanimidade no continente de maneira que a transgressão e subversão são cada vez mais sedutores.

O meu Rio querido já não tem nem mais heróis ou anti-heróis. Nesta época do ano a chapa começa a esquentar legal, o cinema invade a cidade e deixa todo mundo com mil idéias na cabeça, o calor empurra todo mundo pra praia, e quem não pode tar lá fica ainda mais puto. A chapa esquenta e as eleições ajudam. Pela primeira vez desde que nasci um filho da puta diferente vai ser presidente, a direita enfraquecida toca seus golpes sujos a torto e a direito. Comemorando o primeiro ano de uma nova era o 11 de Setembro no mundo todo teve crianças bravejando as estrelas e faixas azul-vermelhas e um clima de paranóia geral. Enquanto isso o Rio de Janeiro segue cada vez mais neurótico desde que sairam prendendo todas as lideranças do tráfico que apesar de continuarem comandando tudo desde os presídios (via celular ou advogado, foda-se) não conseguem controlar o ânimo dos mais exaltados do bonde, aqueles malucos que tão cagando se vão levar a bala hoje ou amanhã. O terror comia adoidado pela cidade, principalmente na area dos terceiros, mais desorganizados e exaltados, dai o Beira-Mar, grande responsável por esse bagulho paraguaio prensado e fedorento que a gente chama de maconha, resolve dar um jeito, escolhendo o 11 de Setembro para tal. As cabeças de quatro terceiros que viraram mun-há foram empilhadas no pátio de Bangu, enqaunto um dos líderes dessa facção era torturado e obrigado a ligar pra todas as suas bocas falando que tinha migrado pra facção do Beira-Mar… A governadora Benedita intervém, tranca os chefões a sete chaves no QG da PM e é bombardeada de todos os lados. Nenhuma dessas pesquisas eleitorais sem vergonha disse que ela ficaria em segundo lugar, de maneira que muita gente anti-Garotinho deixaram de votar nela pra votar nos candidatos que eles diziam estar em segundo lugar. No final das contas a Benedita ficou em segundo, mas com insuficiente votos pra levar a disputa pro segundo turno. A Rosinha Garotinho, eleita pela massa de evangélicos ignorantes que povoam o estado (porque NINGUÉM é tão idiota pra votar nessa puta) já avisou, vai tirar os bloqueadores de celular dos presídios e a Benedita, tá jurada de morte pelo CV. Agora me diz… quem tá de que lado mermo!?

No 11 de Setembro tava tendo uma festa no Odeon (sempre lá), enquanto a Zona Norte toda estava no maior caos com as favelas do TC fechando escolas e comércio desde de manhã e o pessoal que trabalhava no centro impedido de voltar pra casa. Como a Zona Sul é toda do CV eu nunca tive esses problemas, e na data essa era até uma desculpa pra levar alguém pra dormir em casa. Dias depois, exatamente seis dias antes da eleição as escolas municipais de toda cidade amanheceram fechadas, e logo comerciantes por toda cidade foram pressionados por telefone ou visitas a seus estabelecimentos a “fecharem a loja”. Era uma segunda feira ensolarada, e logo todo o comércio da cidade estava fechado, a maioria dos transportes públicos deficientes (as barcas rio-niterói nem sairam da estação) e a praia lotada. Amigos que foram a praia diziam que a maioria das pessoas ficou sabendo das ameaças via boato, mas mesmo assim fecharam a loja e foram pra praia, óbvio! O carioca sabe tirar proveito de tudo.

Visto assim parece até malandragem mas a real é que foi o maior micão. A justificativa desse “luto” forçado era que a prisão do Beira-Mar violava os direitos humanos, visto que estavam lhe negando visitas. Aliás todas as ações do CV desde então começaram a serem identificadas pela mídia como “atentados”, cada vez mais se esforçam para tornar os criminosos que a gente conhece em terroristas. Aqueles que o W.Bush jurou erradicar de todo o planeta. Mas a gente que é inteligente vê que não é bem assim, com o poderio bélico desses grupos, sua lógistica, populariedade e grana eles poderiam muito bem sacudir o país numa guerrilha revolucionária em algum ponto de vista. Mas não, fica cada vez mais claro que estes grupos tem envolvimento direto não só com as policias como políticos e milicos, especialmente aqueles dos setores mais reacionários.

Nessa segunda-feira sem lei fui assistir um show do Los Hermanos no Teatro Rival. O show tava vazio porque a mãe da maioria dos fãs dos marmanjos não os deixaram sair de casa, mas o show foi lindo como sempre, armadilha infalível. Saí de lá com uns amigos da E-Zine bem alegrinho e decidido que a festa não podia parar. E foda-se que aquele tinha sido um dia escroto, era noite e a noite é dos loucos, que pra esses caras são tipo uma clientela e pá! Fomos pro Ball Ruim onde rolaria um show do Arnaldo Antunes. Rolaria, chegamos lá e a muvuca na rua até nos fazia pensar que o show estava rolando e bombando, mas na real era um monte de gente indignada porque o Ball Ruim recebeu um telefonema dizendo que “se o show rolasse iam passar metralhando geral!!!”. Porra! Aí eu fiquei puto! Duvido que alguém do Dona Marta tenha ligado pro Ball Ruim pra dizer isso… Peraê… Será que eles leram a respeito do show no Rio Fanzine!? Sei lá…
O Quarteirão todo tava fechado, até o Teco Taco e Fornalha! Porra! O Fornalha é um dos poucos estabelecimentos 24hs da região de Botafogo Valley que nunca nos decepciona! Ninguém merece isso! Reunimos um grupo de pessoas bem-dispostas e fomos até Copacabana, na esperança de que a tenda da coca-cola light, montada em frente ao copacabana palace para oferecer rega-bofes aos convidados do Festival de cinema, estivesse rolando. Estava! Ahá! Nada pode parar o cinema nacional!!!

A festa estava um fracasso para os padrões do festival, mas logo foi reunindo malucos de toda parte da Zona Sul, cada um com sua história de programa frustrado. Todos lá bebendo as custas da coca-cola e da BR e discutindo política, corrupção e eleições… política, corrupção e eleições…
***

Voltando ao centro da cidade, no fim do primeiro dia de filmagens de “Monstros L.A.P.A.”… Tava pra começar “Hollywood, Hong Kong”, interessantísimo midnight movie sobre um cafetão que comanda um serviço de putas via internet de um barraco numa favela de Hong Kong. Excelente filme cheio de orientais vestidas de colegial, ruídos de ICQ e carne de porco, pena que outros porcos não deixaram a gente ver o filme até o final. Se durante o dia todo os Inumanos estavam pagando mico, chegara a minha vez.

Invadimos o cinema cheios de tralha, mochilas, toca-fitas, uma bolsa enorme com roupas e a lança zulu de dois metros. Nos direcionamos pro cantinho do mezanino do cinema, onde ninguém vai e a gente pode conversar numa boa, sem atrapalhar ninguém. Assim que começa o filme uns seguranças aparecem e dizem que nas cabines por ordem da gerência só de pode assistir os filmes lá embaixo. Nós dissemos que estávamos lá em cima porque gostavamos de… conversar durante as sessões… comentando o filme e tal! Coisa de crítico! E lá embaixo estava lotado e a gente não queria incomodar ninguém. Não colou!!!

Decemos e sentamos na última fileira, relativamente isolada e começamos a curtir o filme. O filme tava ótimo e lá pela metade vimos que tava na hora de queimar uma conversa. Lá mesmo, lá embaixo, foda-se! Todos aqueles criticos e filões estavam acostumados a isso mesmo então nem existamos. Bem, quando nosso papo chegou na ponta vimos aquela lanterninha lá longe, dispensamos o papo-furado e prestamos atenção no filme. O segurança, um babacão de olhos azuis e cara de boneca só passou encarando-nos, e saiu da sala. Uns dez minutos depois ele retorna.

- Desculpe-me, mas a gerência quer que vocês se retirem da sala!
- E porque isso!? – respondi sem me mover do lugar!!
- Ordens da gerência!!!
- Escuta amigo! Eu tou trabalhando aqui! Sou crítico de cinema! Por favor deixa eu ver o filme! Você está atrapalhando meu trabalho…

Meus dois amigos insistiram no caô e o segurança deu o fora da sala mais uma vez. Ainda não tinhamos chamado muita atenção das outras pessoas que lotavam a sala. Daqui a pouco o segurança retorna com um sorriso maléfico e eu já presenti que aí vinha merda, mas não mudei meu descurso…

- Tem gente lá for a querendo falar com vocês!!!
- Foda-se!! Eu preciso ver esse filme, e não sei do que você está falando!!!

O cara saiu denovo e em menos de cinco minutos retornou com dois ratos fardados de cinza. É claro que o papo já tava malocado há muito tempo. O PM mais coroa, com a pistola na mão foi logo dizendo

- Todo mundo aqui pra fora!
- Ihhh… Qual é!? Que que a gente fez!???? – tentou argumentar algum de nós, ainda sentado.
- PRA FORA PORRA!!! – Disse o PM, em voz alta apontando a arma pra gente, enquanto o lanterninha ofuscava nossa visão jogando a porra da lanterninha na nossa cara e tudo que eu conseguia ver atrás da silhueta do PM era toda aquela massa Cult revirando-se nas poltronas pra me encararem assustados… Puta que pariu! Eu não ia deixar barato!!!
- Eu sou reportér do maior jornal do Estado!!! Tou fazendo meu trabalho! Me deixem em paz porra!!! – Dizia enquanto saia do cinema carregando minha tralha e puto da vida, sem mentiras, apenas pontos de vista!

Uma vez fora da sala, os canas queriam nos fazer entrar numa salinha apertada do cinema, para dar uma “geral”. Que merda! Mas que segurança cuzão é esse que chama a polícia!? Aposto que ele fez isso passando por cima da gerência do cinema, porque tudo que estes queriam era prender alguém na sua sala numa sessão cheia de jornalistas. Ahhh não! Eles pediram! Agora a gente tinha que fazer um escandalo! Eu e Babão partimos pra essa estratégia!

- Ihhh… Que revistar que nada!!! Diz aê! Que que a gente fez de errado!?
- Vocês sabem! Agora entrem lá na salinha antes que…
- Cês tão ferindo meus direitos de cidadão!!! Vocês não podem nos tirar do cinema assim!
- A gente pode efetuar uma revista sem mandato!!! Se vocês se recusarem a gente pode levar vocês pra delegacia onde eles vão fazer a revista de qualquer jeito! E eles vão achar!!!! – Dizia o PM mais velho, baixinho e com cara de nordestino.
- E lá é delegacia legal!!! Lá não tem essa de papo!!! É artigo desseseis – Completava o outro rato, preto e barrigudo.
- Vocês querem revistar a gente é isso!??? Então revista porra!!! – Disse o babão em voz alta colocando as mãos na parece e abrindo as pernas como naqueles seriados gringos que eles se amarram.
- É revista a gente porra!!! – Disse eu, abrindo a minha mochila cheia de câmeras, lentes, cadernos, filipetas, rolos de filme e uma porrada de lixo e tralha – Agora revista e me deixa voltar pro filme porra!
- Tá bom! Tá bom! Tá bom! É o seguinte!!! Vão embora daqui!!! Vão embora! Só não voltem pra ver o filme… - Dizia o PM, já de saco cheio, vendo que a gente não se assustava fácil. Nessa o panaca do segurança do cinema já tinha entrado e saído da sala duas vezes procurando o papo dispensado.
- Ah! Qual é!!! Eu tenho que ver esse filme… eu Sou jornalista! Trabalho no maior jornal…

Queria voltar pra ver o filme porra! Mas não tava colando! Lembrando daquele episódio do Hunter Thompson no Rio de Janeiro resolvi não insistir. Ah sim! Parece que por volta dos anos sessenta o Thompson passou um tempo aqui na cidade maravilhosa fazendo um trampo de correspondente, sei lá! No site da Araciça tem até uma foto dele no Leme. Dai parece que num certo dia ele e um amigo idiota descolaram uma arma e resolveram atirar nuns ratos num terreno baldio perto de uma favela, a porra do Thompson é fascinado por armas, a favor do armamentismo civil e o caralho! Não demorou pra neguinho chamar a polícia, porém o Thompson malandro que é dispensou a arma antes de ser preso, no entando chapado que é esqueceu umas balas no bolso. Parece que ele foi interrogado por horas na delegacia do turista e no final da história conseguiu desenrolar e tava com os pés em cima da mesa brindando com o delegado. Foi nessa hora que as balas escorregaram de seu bolso e ele foi deportado devolta pros Estados Unidos. Parece que ele não pode voltar aqui nunca mais. O Brasil é foda! Estraga qualquer um! Ate o Batman!
Eu certamente não queria dar uma de Thompson depois de ter me safado tão bem, então resolvemos sair do cinema.

Quando pisamos na cinelândia, do lado de fora do Odeon, os PMs brotaram mais uma vez. Só que desta vez eles se aproximaram num tom de voz diferente, bem mais tranquilo e malandro. Diferente da cagação de autoridade que mostraram no hall do Odeon.

- Porra! Vocês acham mermo que a gente ia prender vocês por causa de um baseadinho!??? Vocês quase estragaram tudo! – Diz o PM mais velho!
- É! A gente queria que vocês entrassem na salinha pra dizer isso! Sabe como é, na frente de todo mundo a gente tem de cumprir nossos papéis!! – Completa o barrigudo!
- Se liga! Já são quase seis horas! Daqui a pouco meu parceiro aqui vai pra casa encontrar com a mulher e os filhos! Você acha mesmo que ele quer ir pra delegacia prencher B.O.? Isso leva tempo pra caralho!!! – Continua o coroa.
- Faz o seguinte! Não voltem no cinema hoje não porque senão aquele segurança babaca vai ficar enchendo o saco! Pega esse baseadinho e vai fumar por aí!!! Porra! Fumar no cinema é sacanagem! Tanto lugar maneiro por aí… – Emenda surrealmente o gorducho!

O que mais a gente podia fazer do que sair de lá dizendo “valeu… valeu…”. Dai a gente dobra a esquina e se caga de rir. A gente perdeu o filme que tava bom pra caralho! Mas pelo menos uma vez na vida a gente virou o joguinho de gato e rato dos canas. E o melhor da história é que o PM concorda que o segurança do cinema é um cuzão e que não vale a pena perder tempo prendendo maconheiro. E a porra da televisão dizendo que a gente é culpado pela “audácia do narcotráfico”. Fala sério…

Voltamos a ter problemas com os canas no último dia da filmagem, quando gravamos a cena em que o detetive Ênio arremessa o Heron de cima dos arcos da Lapa. A gente queria filmar no fim do dia para aproveitar melhor a luz, o que a gente não contava era que essa é a hora em que mais passa bonde pelos arcos e que ia chover pra caralho no dia. Portanto, além de ter de proteger a câmera da chuva e ficar carregando uma besta de madeira e um boneco do tamanho (e do peso) de uma pessoa pra lá e pra cá em cima dos arcos ainda tinhamos que esquivar do bonde a cada cinco minutos. Como? Apoiando-nos numa gradezinha muito fuleira e encolhendo a barriga pra dar espaço pro bonde sempre escoltado por um cana que olhava bolado.

Numa dessas o cana barrigudo pede pra parar o bonde apontando-nos a pistola.

- Que porra é essa? Que que cês tão fazendo aqui!?
- Errr… uma filmagem senhor! A gente é do grupo de teatro da fundição progresso!!!!
- Sei… Ei! E que porra é aquela na mão dele? Uma besta!? Me dá essa besta! Isso e arma branca!!!
- Na besta do meu avô ninguém toca – disse o Juca, dono da besta, abraçando-a.
- É do avô dele… estamos usando na filmagem… Essa porra nem tá funcionando…

O cara acabou dispensando-nos. Mas não seria nosso único encontro desesperador do dia, mais tarde quando tava chovendo pacas e resolve,mos gravar o Ênio arremessando o boneco de uma vez rola o climax da filmagem. O Ênio tava em cima dos arcos com o boneco e o Juca. Como só eu que tenho celular nesta merda a comunicação era feita aos gritos mas mesmo assim o Ênio não conseguia (nem tava afim de) entender muita coisa. Quando ele chegou na arcada que tinhamos escolhido e começou a erguer o boneco avisei o horror! O horror!! Quatro policiais fardados vinham caminhando do outro lado dos arcos a caminho exatamente do pico onde o boneco ia cair. Eles não tinham visto o Ênio e tavam caminhando tranquilamente em fila indiana, imaginando o desastre que poderia acontecer se o boneco caisse do lado, ou em cima de um deles tratei de avisar o Ênio pra não jogar o boneco, mas sem desespero pra não chamar atenção dos policiais.

E o Ênio não ouvia nada… Felizmente o Juca se ligou nos policias e avisou o Ênio que segurou o boneco por alguns segundos mais, o tempo exato dos policiais passarem por debaixo dos arcos, sem perceber nada. Mas daí o bonde aparece e o Ênio liga o foda-se e joga o boneco. A filmagem ficou linda, e os policias viram tudo. Eles ficaram parados olhando pro boneco, em estado de choque e depois viraram as costas, entraram num opala preto sem placa e sairam na contramão.

Se eles não tivessem que matar alguém na baixada nesse dia a gente tava fudido!

***

Tamos lançando o clipe, mostrando o underground do rio pro planet, mostrando como os cariocas provam que dá pra ser original e criativo no hip hop. Que dá pra falar de tudo sem ser da maneira de sempre. Hoje os Inumanos invadem o Hutus nessa função. O Hutus rola há três anos e já é o maior festival de rap do país, esta vai ser a primeira edição onde o rap carioca vai ser representado por outros artistas além do MV Bill. Uma revista gringa de hip hop fez uma matéria ótima sobre o gênero no Brasil e principalmente no Rio, além das fotos do Aori, do Bill, do D2 e do Bernardo a matéria abre com uma fotona de uma mina de top, short, chinelo, uma metralhadora e um pente enfiado dentro do short. Tem informações muito interessantes e precisas sobre as facções, os proibidões (“the song “fogo no x9” or “bur the informer”) mas também tem umas viagens… Coisa de gringo.

O Hip Hop florece nos quatro cantos da cidade, mas lamentavelmente quem mais enriquece são meia dúzia de produtores pit-boys com dinheiro pra investir e uma massa de playboys idiotizados pela imagem de DMX e Snoop Dogg travestidos de marcas caras e terjeitos rídiculos. Há histórias de amigos MCs que foram convidados a trocar um papo com os “jovens empreendedores”, o termo que a mídia usa pra chamar esses filhos da puta de amanhã. O papo foi mais ou menos assim:

- Tu Sabe que o Hip Hop tá na moda. Acredito que é um mercado que dá pra gente explorar ao máximo nos próximos três anos, então eu tou te chamando pra te ajudar, já que tu tá nessa a vários anos. Ma santes queria tirar umas dúvidas me diz, Cidade Negra é hip-hop? Planet Hemp é hip-hop? Max de castro é Hip Hop? Nando Reis é Hip Hop???

Sem noção… e sem contar que a tal da “ajuda” é tipo um cachêzinho de cinquenta merréis… Mas a gente vai sobrevivendo, a boa das quintas feiras agora no verão é o projeto COLISÃO que inaugurou com um show do Inumanos e “Os camisa Preta” (banda formada por roadies do planet hemp e outras bandas, já repararam como os roadies sempre usam camisa preta?), o próximo é do Quinto Andar com o Cabeça. Nada pra isolar, só pra somar!

Eu já disse que nesta época do ano elas estão descontroladas? Estão mesmo… A cada ano que passa esta época tras mais alegria e confusões relativas a essas belas e queridas espécimes da natureza – as mulheres. Estes meses foram fodas, quando eu consegui me libertar do bolo de figurinhas repetidas que vinha colecionando no decorrer do ano e encontrei uma menina com quem achava que ia conseguir dar um gás num relacionamento eu saio pruma balada e esbarramos com umas cinco figurinhas repetidas que me dão a certeza que não dá pra deixar de ser Matias Maxx. Dispenso essa relação possessiva e insana pra conhecer uma outra mina bem mais relax e ir vivendo o verão, aquela preciosidade do passado volta a me dar bola e ao mesmo tempo que eu me dou conta de como ela cresceu tenho a certeza de que a gente só não deu certo porque eu tava começando a ficar Matias Maxx desse jeito… E eu vou te dizer que adoro essa mina, e não me arrependo de nada que fiz na minha vida!!!

***

E pensar que outro dia um reporter aê me fizeram ficar passeando na lapa fingindo estar filmando, enquanto me filmavam com uma Betacam dez vezes maior que minha Mini-DV… Pelo menos mamãe viu e ficou orgulhosa…

É isso! Falei demais! Mas é pra esse povo que lê Info Exame demais não reclamar…

8.11.02

HUSTLE HUSTLER

Chegou o horário de verão, o que quer dizer que tenho mais uma hora de dia, visto que quando não tem mais nada de interessante pra fazer de manhã (como trabalho ou cabine de cinema) eu acordo pra lá de meio dia. Mas venho aproveitando esta escaldante primavera pra pegar um grau lá no nove na companhia de minhas deliciosas amigas modelos e apresentadoras de TV. Mas as coisas nem sempre ocorrem como a gente quer, e quando faz sol você tá trabalhando e na semana em que você tá de bobeira e resolve se largar na praia de segunda a quinta (tu acha que eu sou maluco de ir na praia no finde?) chega na terça e começa a chover, mas pelo menos eu não ia ficar de bobeira, visto que tinha um trampo pra fazer.

A Rebecca do Greenpeace e o Ricardo Oll Dog estavam de passagem no Rio, trazendo consigo a chuva e a missão de colher uns depoimentos em vídeo de celebridades para sua campanha contra a extração ilegal do Mogno e eu ia fazer os stills. O Mogno ao que parece é uma árvore ameaçada de extinção cuja madeira valiosissíma movimenta um esquema cavernoso de tráfico. Parece que os próprios indios cortam a porra das árvores seculares e as vendem por tipo oitenta dólares e elas saem do país clandestinamente via Belém a uns U$1500. Os móveis são vendidos na europa por uma fortuna surreal. Além de não pagar imposto algum esse tráfico degrada legal nosso ecossistema, e tudo isso só acontece porque não tem uma fiscalização decente na amazônia e fronteiras. E todo mundo sabe que onde passa madeira, passa brizola, heroína, ak-47, Farcs e o escambau. Maconha não, maconha neguinho planta em qualquer armário com uma lâmpada!

Encontrei com a galera no apê da Camila Pitanga no Leblon. Muito simpática ofereceu o mate natural que ela mesmo fez.

- Muito melhor que o de copinho… eu que fiz!!
- Só! O de copinho além de ser cheio de química ainda vem dentro de um plástico!
- Pois é! Não tinha pensado nisso…
- Veja só… eu vou no nove direto… lá o pessoal tira mó onda com suas tatuagens e pose de “geração saúde”. Mas porra!!! O copinho de todo mate e guaraplus que esses filhos da puta bebem acaba na areia… Lamentável! Estraga toda a pose que essa “juventude” quer ter… eu pelo menos sou junkie assumido e bebo cerveja… e latinha tá cheio de vagabundo querendo catar… as vezes o próprio cara que te vende fica enchendo o saco de dez em dez minutos pra ver se tu já terminou…

Eu ia agradecer pelo Mate dizendo que tava tão delicioso quanto ela, mas uma voz dentro de minha cabeça me freou: “Segura a onda! Vai ter outra chance!”.
Vestimos a menina com a camiseta da campanha e começamos a entrevista. Tão simpática quanto indignada queria saber porque que a gente não usava o SIVAM pra controlar esse e outros tráficos (afinal não é isso pra que ele serve?). O sorriso dela me enfeitiçou tanto que nem lembro direito da entrevista, sei que ela disse que queria conhecer a amazônia, que todo mundo devia pressionar o governo para preservar o que para muitos cariocas como ela parece um paraíso distante, mas que tá ameaçado.

De lá voltamos pra Botafogo Valley onde encontramos o Seu Jorge num estúdio fotográfico, ele vestia uma camiseta com a ultrasonografia de sua filha estampada – Olha só! Já dá pra ver o narizinho achatado – dizia a mãe, feliz com seu barrigão. O Seu Jorge eu sempre esbarrei nas noitadas, tipo na época em que eu começei a fotografar, a época do Farofa Carioca que surgiu como um negócio bem legal, misturava os ritmos que faziam a cabeça dos verões maconheiros do rio de janeiro com uma levada pop. O grande pecado foi embarcar com outros grupos numa viagem erradíssima de chamar o antes indiscrítivel som de MPC (Música Popular Carioca), rótulo tão sem vergonha quanto pretencioso, pra completar o disco que gravaram não era tão bom quanto os shows. Não demorou pra começar a incomodar, não a música, mas o que ela representava, daí pra gravadora jogar no congelador foi um passo. O triste destino de toda banda que não consegue seus cem mil de cara.

Eu já me diverti bastante em alguns shows do farofa (teve uns no horto junto com a bateria da mangueira em pleno carnaval que foram foda!) e sempre admirei a voz do Seu Jorge mas como já disse não curtia o que ela representava. Aquele pessoal da PUC travestido de hippie dizendo que “preto é lindo” e sacaneando a empregada. Não levava fé no cara por conta dessa história de MPC até conhecê-lo legal viajando para Belo Horizonte com o MD2 e Funk Fuckers. Foi uma viagem de ônibus, bem naquela astral “rock’n’roll is coming to town”, peguei o ônibus com os Funk Fuckers lá no estúdio Casa 3 em copacabana e fomos buscar o bonde do Marcelo na Zona Norte, eles tinham acabado de abrir um show pro Bezerra da Silva e tava todo mundo muito louco trazendo vários brindes do camarim. Quantas horas são até Belo Horizonte!? Eu não sei! A gente deve ter demorado o dobro de tantas vezes que paramos pra fazer refill no estoque de cervejas. Bandejas e cigarros suspeitos passeavam pelo ônibus que além do pessoal das bandas trazia um uns bicões como o Formigão, um mano que até hoje não sei o nome, o Seu Jorge e Matias Maxx, lógico. O Seu Jorge fazia uma participação no show do Marcelo, tocando um sambinha no violão, e foi o primeiro a perceber, de manhã, quando todo mundo tava tentando dormir que chegamos em BH, tratando de acordar todo mundo gritando – vamos abrir a loja! Vamos abrir a loja!

Na volta, sentei do lado do cara que veio tocando vários sambas obscuros que pareciam até Funks Proibidos e rimos bastante. Mudei totalmente minha opinião a respeito dele que um par de anos depois lançou seu disco solo no Humaitá Pra Peixe, nessa ocasião eu tava preparando um fanzine pro festival e fui entrevistá-lo junto com uma amiga que tava tocando o caô comigo. Ele tava morando numa cobertura no Flamengo, de frente pro morro azul e logo de cara colocou pra gente “Garota Zona Sul” da Jovelina Pérola Negra que ele apresentou como tia sua.

“Ai que vontade que eu tinha de ter um carango joinha,
e morar na Vieria Souto… Ou em copacabana!
Só de motocicleta Honda e muita grana…”

Fiz umas fotos dele largadão numa cadeirinha de praia na cobertura enquanto o entrevistávamos entupindo-nos cerveja. Assim que a entrevista e a cerveja acabou ele pediu pra que eu descesse pra comprar mais, falou isso com uma cara de safado singular, afinal a mina com quem ele ia ficar a sós por alguns minutos não era de se jogar fora. No final das contas acabei descendo umas duas vezes mais e ficamos bebendo noite adentro, até uma dessas apresentadoras de TV tocar a campainha pra uma visitinha surpresa. Tá bom… Por essas e outras que deu a maior felicidade ver o cara de cabelo dessarumado empunhando um fuzil na pele do bandido-mocinho Mané Galinha no campeão de bilheteria “Cidade de Deus”.

Hustle Hustle Hustle Hustle…

O depoimento do cara a respeito do mogno foi legal. Ele olhava e apontava pra câmera com a autoridade das ruas cobrando do governo a tutela da região e comparava os biopiratas ao beira-mar. O cara diz que seu trabalho solo é puro Bebeto, que eu desconheço, mas identifico o Jorge Ben. Pretinha… Pretinha…

Hoje vou ver o Planet Hemp, uma das poucas bandas boas desse país que consegiu o respeito de cara e moral na gravadora. Não fazem tantos shows quanto essas outras bandas que tão na TV, até porque pelo papo e trilha deles neguinho não deixa e também não tem tantos discos. Mas também não tem discos ruins e faz parte da história de uma cidade e da música de um país. Diferente do que muita gente idolatra por aí certo de que vai se envergonhar daqui a uns vinte anos…

Pena que o show é na Barra.

Ah! Mas o que importa é que eu fiquei com uma foto da Camila que eu mostro pros amigos que vem aqui em casa dizendo que “é minha nova mina”.
E alguns manés caem!

29.10.02

¿PuTa ou PuTa?
(original rude boy style)


“Si el hombre quiere el pedazo diga que pague por el,
Si el hombre quiere me la tiene que pagar,
Por que hay muchas cosas que tu tienes de comprar,
Y a tus hijos tu tiene de cuidar,
A la escuela los tienes que mandar,
Sin plata no hay nada Papi,
Sin plata no hay amor,
Sin plata no hay casa, ropa, ni nada de comer…”
(Si el hombre quiere – La Atrevida)

- Legal sua boina… tu é hippie?
- Hein!?
- Tu é roqueiro né?
- Ahn… tipo isso… mais ou menos!
- Eu nem gosto muito de Roque… esses roques pesadões…
- Pois é… eu também não!
- Hmmm… tu tem mó cabelão né?
- Ha! Ha! É… tipo isso…
- O meu vinha até a bunda mas eu cortei… esconde o corpo!
- Sei… Diz aê! Em quem você votou!?
- No Lula! CRARO!
- Porque!?
- Porque eu não queria votar em alguém que só governasse pra quem tem!!!
- Maneiro… O Serra não dá né!? Ainda mais com aquela cara de vampiro…
- Ah! Mas o Lula também parece um Lobisomem!!!
- Hahaha… Cê votou nele nos dois turnos!?
- Não… antes eu votei no Garotinho…
- Tssss… então pra governadora…
- Votei na Rosinha!
- Rosinha!? Tu é evangélica, PORRA!? Socorro!!!

(…)

- Tu é roqueiro né?
- Ah! Qual é? Prrr… Mais ou menos…
- Hmmmm… tu curte reggae né?
- Ha! Curto o reggae…
- Fui no show do Planet Sábado…
- …no Olimpo!?
- É! Foi maneirão… Tem denovo na Barra dia oito, eu vou!
- Ha… Maneiro… O Planet é clássico… Tudo gente boa!
- Hmmm… que que tem nessa bolsa? Filmadora!?
- É!
- Cê tá fazendo um filme pornô!?
- Hahahahaha… Hoje não, mas não é uma má idéia! Você já fez!?
- Fiz um… Lá pra fora, com um Jamaicano!
- Deve ter se enchido de grana!
- Nem… Eu era só a primeira menina do filme, ganhei 1500 reais!
- E porque você não fez mais!?
- Rolaram umas propostas de fazer uns filmes Brasileiros, mas eu morro de vergonha de algum conhecido ver!
- Como assim!?
- Fala sério!! Eu vou todo dia na locadora pra ver se esse filme não foi lançado aqui!!! Só faço isso lá pra fora!!!
- A gente podia fazer um! Mas um negócio underground, um lance assim… Artistico saca!? Que que cê acha…
- Vai vendo…

(enquanto isso na mesa ao lado)

- …Ah! A gente podia ir no cinema né!?
- Imagina!!! Não posso! Eu tenho noivo!
- Noivo!??? Fala sério… E trepar? A gente podia trepar né!?
- Período de 20, 30 ou 50 minutos!?

14.9.02

ELES VIVEM

Não dá pra acreditar. Não dá pra aceitar. Mas é a dura realidade. Eles vivem!
Não são mais fortes… Mas certamente mais numerosos…E te odeiam! Porque te invejam! Invejam porque te vêm entrar e sair de casa com uma menina mais maravilhosa que outra. Te invejam porque sabem que mês sim, mês não tu tá de rolé… Te invejam porque mesmo sem entender direito como tu ganha tua grana sacam que tu não tem de obedecer a um patrãozinho de merda! Ai se soubesse que na maioria das vezes o faço de cueca…

Eles te odeiam pelo cabelo, tatuagens e vida loca que jamais tiveram corajem de ter.
Não são mais espertos, porém mais poderosos. São mal comidos, mal-paridos e não aceitam conhecer alguém feliz de verdade.

Deleitam-se em imaginar que podem te caguetar, te entregar numa bandeja praqueles que se dizem autoridades fazer contigo o que quinhentos anos de mal-tratos fizeram esta sociedade aceitar.

Mas o que mais os enervam é a realidade… De que num futuro próximo eles podem continuar não gostando de mim… mas já não posso dizer o mesmo de suas filhas…

31.8.02

Budz´n´Buttz

São Paulo é estranha. Pessoas a um fuso horário de distância não param de falar em "Micosystem", é que por aquelas inúmeras tretas um bando de PTAs foram cancelado, incluindo todos os paulistas. Esse povo que ficou, alguns até chegaram a ir pro aeroporto de mala e cuia, perdeu a festa e se emputeceu e começou a espalhar por aí que o evento foi um fracasso, enquanto na verdade ele aconteceu por milagre, e por isso foi um sucesso. A real é que o Agosto almadiçoou geral.

Na sexta-feira dois aviões da TAM fizeram pouso forçado, nosso broder Yuka que deveria ter vindo pra sampa prum show do DUB mamute ficou em casa porque teve uma treta no coração. E o loki que tem uma clasula no contrato dizendo que "o hotel não pode ser mal-assombrado" decidiu não viajar pro Brasil. Lembro de quando o Mad Professor apareceu com a banda do Lee Perry no aeroporto de Manaus a primeira coisa que perguntamos foi o paradeiro do LeePa!

- he had problems leaving Zurich... he´s coming later!
- Like, on another flight later this night!?
- Like tomorrow...
- oh! but the festival ends tonight!
- oh!

Deu pra sacar na hora que o hustler de Kingston que virou DJ simplestemte por ter presença e aparência nervosa, e por conta disso protejer os discos, não ia aparecer mesmo. A confirmação veio ontem com essa história de mensagem almadiçoada no bilhete de avião. Pode ser que como no mundo de Pimp and Players "it´s all about money". Once a hustler, always a hustler...

Mas tem que respeitar o velinho que meteu uma Seni na fuça dos manos dos Maytals, uma cascuda banda de Ska, e disse "relaxem... você da guitarra, marca o ritmo, vou aumetar o teu baixo... a bateria junto com o baixo... isso... isso...". Anos depois não contente em ter inventado o Reggae e produzido os melhores albuns de um tal de Robert Nesta Marley, o coroa resolve pegar aqueles tapes antigos e brincar com os baixos, baterias e delays... e criou o tal do Dub...

O Show de ontem foi diferente da cabaninha emfumaçada de Manaus, onde o Professor Louco dubbou tapes e mais tapes.. Desta vez tinhamos baixo, bateria e teclados. E glorosia abertura do broder Gustavo Black Alien, num show ensaiado e fechado, desde a Ecosystem que eu não via um show do Gustavo que atualmente tivesse canções. E olha que naquele show um tava muito puto com o outro... Mas nas dezenas de outras vezes que esbarrei com ele e seu microfone era tudo fragmentos de sons e improvisação sobre um ou mais temas. Aqui o cara aprersentou um shoiw totalmente dub, com varias canções antigas e novas... Assisti junto com uma hippie lindissima, pequena, de rostinho fininho e dreads implantados. Estavamos fugindo da Babylonia e refugiando-nos cada vez mais escondidos e intimamente para celebrar a Ganja num astral I&I. Dai bem no climax a mina me manda a seguinte

- pô bicho, trouxe um bandeirão do Bob aê!!!

Dai eu percebi a idade da mina e preferi deixar o melhor pra depois, com latas e spliffs no sangue enquanto rolava "Burning and Looting" e "Chase the devil"... Um e Um, detendo o conhecimento da Babilônia e sua nova ordem mundial. Respeito! Paz! Um coração! Um amor!

30.8.02

Wake´n´Bake

Manaus colocou o povo numa sintonia tremenda. Onde um ajudava o outro por acreditar estar fazendo parte de alguma coisa importante e curtir um a vibde do outro. Não vou dizer que na produção não tinha gente que dava vontade de esganar as vezes, mas com a maioria das pessoas rolou uma sintonia correspondida na brodagem ou no carinho, porque o amor cura tudo. A trutagem acabou me rendendo o apelido de Menino Maluquinho entre a galera da equipe de Video, de maneira que acabei vindo parar em Sampa caindo na casa de um desses video-trutas. A casa além de bem localizada é super confortável e grande, o cara é um desses que abriga um pequeno museu de cultura pop na sua videoteca, inúmeros DVDs e Quadrinhos. Feita pra hospedar um bando de gente além dos dois cachorros nesta época a casa tá parecendo mais um daqueles Reality Shows da MTV, só que filmado em Amsterdã.

A rotina é tipo assim, acordar, rolar um Sensi e ir atirar e atropelar inocentes junto com o Bob Burnquist. No PS2 claro!

- Sabe cara!? Eu perdi muitas horas da minha vida naquele Tony Hawk Pro Skater, fiquei tão viciado que sonhava com aquela porra, e dai rolou o X-Games eu fui ver e tava tão acostumado com o Game que achei todos vocês uns pregos "pô, o cara só consegue dar 540? eu dou 720 mole, mole..."

- Ha! Esse jogo é foda, mexeu com a cabeça até da gente... - ri o top skater vegetariano.

Ontem, depois de não fazer porra nenhuma o dia inteiro, acabamos indo pruma balada com umovo do Greenpeace,o Mad Professor e o Sinclair (o rasta coroa, que descobri ser baterista), depois dos caras provarem inúmeras caipiroscas de carambola e babarem em cima de uma das habitantes de nossa casa, os levamos de carro de volta ao hotel. Dai a gente tá ouvindo o Arkology do Lee Perry e o Mad começa a batucar as bases nas coxas e cantaro-lar os graves, dai a genet começa o interrogatório.

- Vocês sabem... Dub music é pai de toda eletrônica. Nós inventamos o remix há mais de quarenta anos atrás. Hoje em dia dá pra se fazer muita coisa com os computadores, mas computadores necessitam sem programados, computadores não são nada espontâneos...

Dai eles pediram pra gente deixar eles na esquina da Augusta, porque a gente tinha dito que lá tinha um loja de discos boa e ele disse que queria ver a vitrine. Acabamos deixando-os no hotel não muito longe dali. Eles nos comprimentaram numa boa e nem entraram no hotel, falaram que iam "take a walk" e desceram a rua rumo à Augusta... Nem sombra de dúvidas acerca do que eles tavam atrás...

29.8.02

DE UMA SELVA PARA A OUTRA

Paz! Respeito! Um amor!
A EcoSystem aconteceu denovo! E recarregou as baterias de todo mundo, enchendo-nos de força suficiente para arrancar cabeças e saltar edificios. Não foram pouco os problemas e correrias, tampouco as glórias e prazeres, porque todos sabíamos como trabalhar. A melhor maneira de sobreviver é com o amor, o amor cura tudo.

O Greenpeace, que deveria fazer a orientação ecológica do evento, ameaçada com os boicotes ao mesmo teve de vestir a camisa e efetivamente produzir quase tudo no evento, pois qualquer vacilada comprometeria seriamente o nome da instituição, sempre patrulhada por madereiras, jagunços e políticos de merda. E ao ver toda aquela gente querida se matando para fazer o lance acontecer, não tinha como não vestir e fazer o possível também, seja servindo de babá de gringo ou catando o lixo da festa do chão.

Buscar os artistas no aeroporto exigia que dormissemos pouco, pois tinhamos que tar lá antes de meio dia. No entanto era bacana porque a maioria era super sangue bom e respeitavam a causa que carregávamos. Caras como o Bamba ou o True Master Killa não davam muito mole, mas conversavam na boa enquanto filosofavam e pregavam:

- Manaus vai ser uma das maiores cidades do mundo! Eu sou um visionário! Eu consigo ver as coisas antes que elas acontecem - dizia o True Master.

Eu tou ligado nisso também, dá pra sentir o cheiro da merda que vai acontecer daqui a um par de décadas naquela cidade. Escrevi um quadrinho a respeito. Tão assutador quanto olhar a imensidão verde da outra margem do Rio Negro era um dos caminhos do centro para a festa que só passava por todo tipo de quartel e vila militar que você pudesse imaginar, inclusive o maldito projeto SIVAM, tipo assim uma base com tecnologia gringa feita para monitorar a região pra gente, ou seria monitorar-nos de nós mesmos?

Ir buscar os skatistas também foi divertido. Eu já conhecia alguns deles do X-Games, além do Julio Feio que é um dos poucos Pros do Rio que tá sempre na nite, mas dai deu pra trocar idéia com bastante deles. Era sempre divertido ver a reação da galera ao calor infernal de quarenta graus com extrema umidade, numa terra onde não importa quantos banhos você tomar, você vai estar sempre suado. Mas onde o sexo melado e caliente é uma constante. E vem voluntária e vai gringa, todas as cores, idades e estilos. Um par de skatistas do sul reclamavam que só tinham trago moleton, enquanto a maioria só resmungava reclamando de um skater coroa que não parava de cagar regra na outra van. O cara é tão caga regra que dava pra ouvir de uma van pra outra... Tipo assim...
Mais tarde no campeonato foi a maior loucura, sol infernal deixando todo mundo passando mal e fãs querendo arrancar pedaços do Bob Burnquist. Depois que ele ganhou o segundo lugar, jogou a camisa, os tenis, o shape, a porra toda, neguinho ainda não deixava ele descer do half, neguinho queria tipo assim uma orelha, um dedo, um escalpo... sei lá... Foi nervoso! Febre na selva!

Aguardando no aeroporto também estava um grupo de entre dez a quinze Rastas locais, eles carregavam toda sua coleção de discos do Lee Perry esperando seu autografo. Nos perguntavam em qual voo ele viria, mas não faziamos idéia visto que o Greenpeace tinha mandado os PTAs pros caras mas eles nunca confirmaram o recebimento. No final acabou pintando o Mad Professor, o cantor Sinclair, o baixista cabeçudo super sangue bão e mais um Rasta coroa que até hoje não descobri o que faz. Eles são caras que emanam espiritualidade e sangue bom por todo poro do corpo. São sujeitos amáveis, coroas sangue-bom, rastas do bem.

Montaram um´puta palco pros caras, com batera, amplificadore e pick-ups. o público se espremia no palco e cameras acotovelavam-se pelos cantos quando o dub começou a contaminar o ar. Um dub bom demais pra ser discotecagem, mas onde diabos estava a banda, que até agora não tinha aparecido no palco, nem sequer no backstage (que era a pista de skate). Demorou uns cinco minutos pras pessoas perceberem que os rastas tavam lá atrás, na cabaninha que abrigava a mesa de som. O Mad tava fazendo o dub, enquanto um dos Rastas cantava com o maior estilo com um microfone estilo madonna, o baixista ficava lá do lado fumando um e exibindoi seu sorriso gigante... ah! o outro Rasta!? sei lá dele... Os Jamaicanos sabem o que fazem!

E dai tu que queria esticar pelo norte e ver umas pessoas que você ama lá perto do Caribe acaba não conseguindo fazer os contatso e magnetizado pelo dub estica a viagem do avião de volta e vai parar em SP na casa de um video-truta super milgrau que tu conheceu lá. A casa é confortável, e o cheiro do reggae tá sempre no ar... A cidade é horrorosa mas tá pra ser tomada por quatro dias de dub... ontem teve o Bamba com Sano, Speed, Max e outros rimando...
Massa... Massa...

24.8.02

motherfuckin M A double X in da house!

O monoteismo condicionou-nos a acreditar no MAL e no BEM, de maneira que se alguma desgraça acontece você pode por a culpa no maldito do cramulhão ou perguntar-se - porque deus deixou isso acontecer? No final das contas a coisa é bem mais complexa do que essa bipolarização, mas uma coisa é certa, o pensamento positivo te conduz pelo CAMINHO DO BEM! Enquanto a negatividade só te fode e destroi... Forças fo mal extremamente poderosas entram no caminho do bonde do BEM, debilitado e pequeno, mas cuja Vibe consegue superar qualquer treta e fazer as coisas acontecerem.

A Ecosystem deste ano não tem a mega-produção e os alucinógenos do ano passado, mas tem uma Vibe muito poderosa. O evento do ano passado certamente acertou a cidade com uma marretada. Neste ano o público só não é muito maior do que o do ano passado, como muito mais antenado. Há menos grana e apoio de fora, mas muito mais boa vontade e garra vindo de todo mundo que está envolvido do projeto, da produção ao artista. A cidade transformou-se, hoje existem várias produtoras tocando o movimento eletrônico na cidade, que como não podia deixar de ser é predominantemente JUNGLE. Acabou de voltar de um workshop da Amazônia Tribal, que tem um terraço onde rolam happy hours e troca de idéias/conspiração. O mundo é guiado pelos filhos da puta do MAL, mas disseminando nossa informação e boa vontade, chegamos muito longe e movemos muitas, muitas paredes...

PAZ e RESPEITO!!
O CHAMADO DA SELVA

Definitivamente leva tempo pra cair a ficha. Leva tempo pra você perceber a magnitude de um evento, quando você finalmente se dá conta que está numa estrutura fudida no meio do mato, vendo DJs e MCs do mundo todo te presenteando com o que rola de mais foda no universo Jungle-Dub a primeira coisa que te dá vontade é de sair ligando pra todo mundo que você conhece.

- Cara! Pega um avião e move your ass up here!!

Me colocaram num quarto do Tropical com o Brian, um loki de dreadloki que atende pelo nome de DJ Walking Stick, vem da remota cidadezeca de Pittsburg, Pensilvania e põe um Jungle Old-School de primeira, com muito Ragga e Dancehall embutido. Como são poucas minas pra tanta produção, e a minha credencial é de produção, os gringos todos me tiraram de babá, o que é legal por um lado mas chato por outro. No final o que fica é uma confusão só na cuca, e você não sabe mais em que idioma tá pensando. Quarta feira buscamos o Bambataa no aeroporto, assim que o cara desembarcou, notei que o neguinho com cara de figurante de filme Gangsta era estupidamente familiar. Claro!! Era o MC Sano, um loki de Santo Domingo que eu conheci em NYC num show do Delinquent Habits! Na ocasião ele ficou animadissimo por conhecer alguém do Brasil, porque ele queria conhecer nosso Rap e aprender a rimar em português. Na ocasião falei pra caralho do Hip Hop Rio, que o cara vai poder conhecer um pouquinho hoje isto é, se alguém aparecer, supostamente D2, Bernardo e Gustavo devem tar pra vir hoje. Mas as coisas estào bem confusas.

Ontem os Britânicos dominaram o pedaço, o figurissima MC Fun rimou durante umas quatro horas sobre as batidas graves do meu Buddy WalkingStick, e em seguida os outros Ingleses como Dr Caché e L Double do Urban Takeover crew. Depois de surpreender bastante rimando sem parar, descendo do palco pra se misturar na platéia e pulando que nem um louco nem dava pra perceber o quão chapado o cara estava de cerveja e o patchuí que eles chamam de maconha por aqui. No final, quando o Mario Z invadiu o micrfone pra representar o DnB do Rio o tal do Fun chega pra mim e pede por favor - Take me back to the Hotel.

Fui escoltando o cara da maloca Jungle até o estacionamento, onde tive de rebolar pra descolar uma Van. No caminho o cara parava pra falar e apertar a mão de todo mundo sempre pedindo pra que "Save the AMAZON MAN!" e cantarolando o clássico de Cindy Lauper

Girls just wanna have fun... yeah! Girls they wanna have fun!
O site da PLAY publicou uma pequena reportagem sobre os preparativos da Ecosystem, confiram para saber um pouco mais do sem fim de tretas que envolvem o evento.

http://www.pl4y.com.br/materias/ler.asp?id=52092



Matias Maxx bate altos papos com o padrinho do Funk.
"A gente ganha mal mas se diverte!"

22.8.02

O Greenpeace é assim...
Um escritório do caralho com uma verdadeira Bat-caverna na garagem (barcos, botes, blindados e afins por toda parte), várias colegas estilosas, simpáticas de tattoos e dreads, um povo sangue bom, rango bom, colegiais voluntárias e muito, muito, muito trabalho nesta terra nortenha onde por mais banhos que se tome você vai estar sempre suado.

Fazendo de tudo, desde buscar o Afrika Bambaataa no aeroporto (e vir ouvindo um papo completamente conspiratório sobre as influências da família Bin-laden na Harvard e várias corporações, além das teorias de que o Egito antigo era porto de ET) até ajudar a catar o lixo do pico do evento.

Não dá nem pra acreditar que em algumas horas vai estar acontecendo a EcoSystem 2.0, diferente do ano passado, quando o governo injetou uma verba parecida com a de Parintins (o maior e mais tradicional evento da região) desta vez é uma caça as bruxas só. Além do boicote vindo de todos os lados, empresarias e governamentais ainda rola uma patrulha na imprensa, acusando a ecosystem de ser um evento que promove o uso de drogas, incita a violência e causa impacto ambiental. Criticas plantadas por uma ONG de fachada que na real quer promover seus eventos de forró na mesma estrada do pico do greenpeace sem concorrência.

É incrível e triste ter de admitir que os Manauaras em geral tem pé-atrás com o Greenpeace. Mas visto os poderosos que estes ambientalistas enfrentam é de se compreender o medo da população, os carros blindados e todas as cameras pelo escritório. Cadê o Capitão Planeta pra nos proteger!?

20.8.02

Agosto de 2002. Matias Maxx está prestes a fazer 22 anos, prestes pra viajar atendendo o chamado da selva. A maior parte do território e população mundial está no hemisfério norte, portanto morar no sul do mundo é um previlégio pra poucos, apesar daquela tirinha da mafalda onde Guille observa o globo e descobre que estamos de cabeça pra baixo – por isso as idéias nos caem – reflete a muchacha mais nervosa do mundo das Hqs.

Mafalda era uma gordinha cabeça dos anos sessenta, tão contestadora quanto inocente. Mais que um personagem, todo um espírito, um sentimento que independe de idade. Por Quino, Mafalda nunca evelheceria, o problema é que os tempos mudaram. Os tempos mudam mais rápido do que nunca. Mas espíritos e sentimentos permanecem, não se podem matar idéias porque são a prova de balas. Ainda dá pra namorar aquele idealismo sabroso ao som de um violão sob aquele horizonte estrelado do sul do mundo. Aqui há um povo que carrega a música em seu sangue, como o herói que os filhos da puta nunca vão conseguir calar.

Questionador e aventureiro sempre me dei bem sozinho. Na minha compania, Matias Maxx já conseguiu ir muito longe, e se divertir bastante no caminho. No entanto ninguém sobrevive sozinho, ainda mais nos dias loucos de hoje.

Tem um ano que eu abandonei o inferno corporativo que enchia meus bolsos de lúxuria e ganância, e fazia meus cabelos cairem de estresse e meus nervos descontrolar-me. Eu tava progredindo, abraçando meu sonho, estava colaborando com uma revista de música que viabilizava meus contextos e me dava uns trocados. Acreditava que do jeito que ia em um ano ia tar muito bem, não de grana, mas de contextos. Pela BiZZ cobri um freejazz, o rockinrio e um abril pro rock, além de desovar várias idéias legais, com o final da revista o que sobrou foi a lorota. Com um par de e-mails e telefonemas bem intencionados consegui a bocada do milênio – ia viver de perto a loucura que seria a tal da “rave na floresta”. Mesmo que não tivesse meio algum pra colborar.

Na insólita aventura na selva eu não tava sozinho. Tinha toda uma fauna de amigos e conhecidos como a Maíra, Bernardo, Pedrão, Zé, Gustavo, Speed e os Inumanos além dos “n” malucos que conheci e reencontrei por lá. Ha! É bom ter marcos para você ter a noção de quanta coisa acontece em um ano.

Fiz uns clipes, um vídeo com alguma repercussão e vários freelas que me divertiram mais do que pagaram e repercutiram e outros que repercutiram e satisfazeram mais do que pagaram. É a sina do terceiro mundo, não que um esteja sendo ganancioso, mas é que tem uma família toda te cobrando por trás. A roubada do ano na real foi entrar no fuso horário da sony, digo do japão, nessa de copa do mundo e tony hawk pro skater. Só serviu pra atrasar a coisa toda.

Conheci o Gaiman e tive a certeza que posso ser um puta roteirista de HQ… tou Elaborando uns roteiros mas a Son… digo o nippon atrasou bastante… Meus desenhistas também são talentosos, mas não aquele exemplo de velocidade e plavra. E o mundo é um ligar complicado demais… os computadores também não colaboram muito!

Computadores fazem arte!? Artistas dinheiro!? Por favor…

O ano passa e mesmo num mundo que só se atrasa e bagunça tu consegue dar vários passos, mas nem tudo sai como planejado. Tava naquela onda de aproveitar o calor, feito uma planta que tu coloca num regime de 24 horas de luz pra ela ganhar força e florescer mais rápido. Pulando de um hemisfério pra outro eu poderia viver um verão sem fim e uma sintonia do caralho com o mundo. Internet faz as distâncias mais curtas, um par de e-mails fez com que Brian me mandasse um álbum duplo do Sizzla mais seis compactos Jamaicanos com Raggas fudidos de um lado e Dubs malucos do outro e mais um LP antigão do U-Roy, um rasta coroa comum assistente anão que canta pra caralho. Rizzo me mandou um CD com centenas de MP3 e belas surpresas por dentro, sementes pra toda uma geração de loucuras.

A Maíra, minha aliada no Greenpeace me botou em contato com a Tica, que me descolou um trampo de fotógrafo pra EcoSystem deste ano. Fazer as fotos de divulgação das atrações do festival, o campeonato de skate e todo o making off. Ralação que certamente vou encarar naquele estilo… Aproveitando que estes dias tou romântico…

Eu amo esta vida. Eu fui feito pra viajar… Me atirar de cabeça. Lembro daquela primeira vez que viajei com meu avô. A passagem era de econômica, mas ele mandou um KO, tinha area de fumantes naquela época, eu fiz cara de asmático e a Varig colocou a gente na primeira classe onde serviam sorvete Hagen Daz e o caralho!

Um ano passa, um ano que você decidiu viver de um jeito. Do jeito certo pra viver, dando nós na cabeça e cagando pra todos os maus olhados. Ganhando dinheiro de cueca e viajando dentro de cabeças, maquinas, estradas e correntes de ar. Tudo vale a pena, porque nada me faz pensar que o passado era melhor, o presente sempre supera tudo.

A partir de amanha tou na missão.

10.8.02

WORKING CLASS HEROES

"Banditismo por questão de Classe"

Já estava arquitetando o cocktail de lançamento do meu vídeo que faria com a grana do Fantástico quando fiquei sabendo que depois de um telefonema do empresário da banda, a emissora desiteressara-se pelo material. Passei o fim de semana a bangu, deixando essa porra pra lá. Fiquei meio puto só porque o mesmo programa já tinha passado uma imagem do Hebert há um ano atrás onde ele aparecia bem debilitado tocando numa clínica. Agora que ele estava são, recuperado e feliz da vida encantando uma platéia emocionada eles quizeram proteger a imagem do cara. Bem, me disseram que o tal do empresário é sangue bão… Tipo de coisa que rola por falta de comunicação.

Dai na segunda feira eu e Rabu invadimos a casa do Marcelo Camelo. O Los hermanos foi uma banda que eu acompanhei bem de perto, estudavámos na mesma faculdade e a galera dos Hermanos era a única com quem eu me identificava no meio daquela futilidade toda. Pelo menso era gente que habitava meu mesmo universo. E naquela época eu cruzava a cidade no carro do rock atrás dos caras, coletando material fotográfico exclusivo que pode ser conferido em parte no site dos caras. Eu conheci o Camelo pelo Alex, eles fizeram fanzines com muita empolgação durante bastante tempo, até que um dia resolveram tentar vendê-lo por um real para pagar os custos e ninguém quiz comprar. O cara se frustrou e resolveu virar músico, experimentando algo totalmente inédito que ele descobriu assistindo o Acabou La Tequila – Que você podia fazer rock, e colocar samba no rock, e colocar latinidade no rock, e se você fizer direito e ser autêntico, sem medo do que vão pensar nem pretensão de ser o que não é… você tá feito! E dai o zineiro frustrado vira músico de sucesso.

Mas a banda que estourava no underground como um hardcore que falava de amor chegou na grande mídia como uns caras do hardcore que tinham estourado uma música de amor. E muita gente demorou pra engolir-los, enquanto aqui no rio todo mundo tinha acompanhado a trajetória e tinha tanta certeza de que a banda podia bem mais que Anna Júlia, que também era autêntica. Foi legal que nessa entrevista o cara conseguiu se soltar e falar de tudo isso. Riu do circuito que encararam de programas de auditório de playback “que é algo muito escroto, mas que não se pode criticar, porque efetivamente ajuda a banda iniciante. Se você acredita que seu som é bom, e se recusa a participar de um programa desses, você tá impedindo que o nível do programa se eleve!!!”. Quando voltei pra casa animado, fiquei sabendo qual seria a missão da manhã seguinte, visitar o Instituto Correcional Padre Severino com o Inumanos. Ótimo! Cagando pra hora que teria de acordar fui zoar na maldita, e quando já tava bem tarde, encontrei com o Lariú e ao confirmar o horário que tinhamos marcado para a entrevista pra MTV no dia seguinte, lembrei que tinha prometido preparar uma fita pra ele. É que o cara tá fazendo uma matérria sobre minha produtora, a Tarja Preta Terrosimo Editorial, e sobre o vídeo que tou fazendo com o Rabu, dai eu tinha que entregar uma fita com algumas imagens pra ele… Cheguei em casa tipo umas cinco… e fiquei capturando, cortando e editando material até umas sete horas…

Lá pelas dez, Aori, Babão, um Angolano Islâmico e um Rasta coroa estavam esperando-nos numa Kombi estacionada em frente ao prédio. Partimos sonolentos até a ilha do governador, onde está localizada a casa de detenção para menores delinquentes conhecida como Padre Severino. Uma assistente social sangue bão amiga do Rasta estava envolvida em algum evento que rolaria no instituto e convidou os Inumanos para fazer um show lá. Passamos tranquilamente e sem revista pela casa protegida por vários PMs de colete e fuzil até chegarmos a uma area aberta, de um lado um gramado isolado pelos altos muros, onde os moleques ficavam, alguns organizados em fila indiana e outros mais a vontade. Do outro lado havia montado um PA onde uma banda de pagode tocava para a diretoria do instituto, acompanhada de delegações de políticos, ONGs e secretarias de não sei o que caralho. Haviam umas mesas com fartura de frutas e pães preparados pela padaria do reformatório, além de galões de café da manhã. Os moleques, de todas as idades, mas a maioria bem novos atacavam as mesas em grupos, num misto de empolgação e cautela. No entanto, em um determinado momento um bonde de moleques entre 15 e 17 anos (que mais tarde viriamos a saber que eram do Terceiro Comando) jogou frutas nuns moleques bem pequenos, de uns oito anos (que era do Comando Vermelho). Antes que alguma confusão começasse funcionários discretamente poram ordem na casa, organizando a saída em grupos da molecagem de volta para a carceragem. O que esperávamos que fosse um evento pra levar Hip Hop para a molecada incarcerada logo tornou-se um evento pra porra da diretoria rica.

Os Inumanos deixaram logo claro de que tinham ido lá para tocar para a molecada, papo vem e papo vai e logo montaram um PA no pátio interno da casa de detenção, onde os moleques esperavam sentados, organziados em longas fileiras de meninos quietos que por um momento me lembraram a escola. Mas o teto tinha buraco de balas (resquicios da última rebelião “controlada”) e as paredes inúmeras pixações e insignías do Comando Vermelho. No chão perto de onde montamos o som havia o desenho de uma AK-47 detalhadamente talhada no chão. Assim que os carcereiros acalmaram, depois de um esporro na molecada, estes arriscaram uma aproximação.

- Tu fuma maconha né!?
- Que que tu acha!?
- Ahhhhhhhh!!! Tô ligado! Aperta aqui!!!

Dai quando eu aperto a mão do moleque de uns dez anos ele chega bem no meu ouvido e diz

- Descola um fininho aê…
- Tá maluco moleque!? Tu acha que eu quero ficar por aqui!??? Quer dizer! Sou maior! Dou um mole desses e vou parar em Bangu!!!

Dai quando Babão terminou de montar o som meteu logo um Racionais, e os carcereiros liberaram os moleques que se levantaram num segundo, por um momento deixando a bandidagem de lado e entregando-se a um espírito juvenil que por momentos deixou aquilo parecendo um animado recreio de colégio admirável em sua caótica inocência. Dai Babão vira do Racionais pro 509-E, a banda do Afro-X, ex-detento e pai da filha da Simony, aquela ninfeta da TV que fez a cabeça de geral durante a infância. Que pouco importa de que apenas um ou outro por ali teriam idade pra lembrar da Simony, o que importava era a fria poesia penitenciária do cara, e sua brilhante volta por cima, regenerando-se através do Hip Hop e realizando a fantasia de toda uma geração como prêmio. Dai que todos eles repetiam em voz alta os versos e refrões do cara, com a emoção de quem está no show de sua banda favorita.

- Cês são da Lapa né!? Tamo ligado!!!

Dai Babão mete a base de “A Batucada” do MD2 e começa um set de turntablism fudido, mandando altos malabarismos com as batidas e as mãos, virando de costas e levantando as pernas que nem na velha escola. Os moleques prestam atenção em cada movimento boquiabertos, urrando e batendo palmas. O público da barra pode pagar as contas do Hip Hop carioca, mas é energia como a dessa platéia que impulsiona o movimento. Logo entra Aori mandando Brutal Crew, instigando a molecada a “fazer barulho”. Em seguida o Angolano manda um som e finalmente Aori encerra o show com Polegar Opositor. Só três músicas, é que agora que os detentos tavam empolgados a diretoria e em espcial o PTista Pitanga aproveitavam a brecha pra falar no microfone.

- Eu já fui um Capitão da Areia como vocês! E acabei num colégio Interno, parecido com este, mas lá me esforcei e aprendi todas as profissões. Carpinteiro, torneiro mecânico, padeiro, alfaiate (…) E hoje tenho dois filhos atores, um é aquele negrão forte que vocês vem na novela, e a outra é a bela Camila Pitanga que todo mundo conhece…

Puta que pariu… Ninguém precisava daquilo… Dai fomos nos misturar na multidão, onde salvo os calouros mais novos e desesperados que se amontoavam na frente, prestando atenção no político na esperança em que a diretoria notasse sua boa indole de garoto do bem e aliviasse a sua pena, a maioria dos moleques estavam lá atrás fumando cigarros e tentando disfarçar a cara feia…

- Escuta… Esse papo que o cara tá falando é legal… Mas tipo assim… Têm alguma coisa dessas aqui!? Tipo, eles te ensinam alguma coisa? Tem aula? Curso profisionalizante essas porras!?
- Rapá! Isto aqui é escola do crime! Cês saem daqui e eles voltam a dar porrada na gente!!!

Vapores Baratos, trombadinhas, pivetes, meninos de rua e ladrõezinhos de sinal. Gente que podia tar me vendendo um baseado ou metendo um caco de vidro na minha mãe, todo mundo junto e aprendendo a odiar.

- Só não perdoamo estRupador e assartante de ônibus… roubá trabalhador é sacanagem!

Chegamos dando a idéia de que eles tinham que entrar na onda do hip hop, que dai talvez eles tivesse uma alternativa quando voltassem à favela. Algumas assistentes sociais tinham projetos para montar oficinas e competições de Rap entre os detentos, o pessoal do movimento estava disposto a ajudar, bastava agora seduzir a diretoria do instituto preucupada mais com o bolso do que eventualmente tratar de seus detentos. Sugerimos que apenas com a união e cooperação dos detentos, conseguiria-se fazer pressão na diretoria pra esses projetos bombarem…

- Acontece que tudo que requer união aqui é dificil, é dificil… Você viu o que aconteceu lá fora! Tem sempre uns babacas que não tão dispostos a colaborar! Isto aqui é escola do crime! Não rola união! Bangu controla tudo! Se em Bangu ficam sabendo que a gente (o Comando Vermelho, facção da molecada com quem dialogávamos) se juntou aos Alemão (os Terceiros, minoria na casa de detenção), pra que favela a gente volta depois!??? O Rio de Janeiro é assim… O que que a gente pode fazer!?

A merda do crime organizado do Rio de Janeiro, que aterroriza a sociedade conivente e facilita o trabalho da polícia, realizando a limpeza étnica-social que eles querem e fomentando uma corrida armamentista simgular. Porque os comandos e estados paralelos já detem armamento e logística pra sitiar a cidade quando quizer, mas perde seu tempo em tretas de gangue e território tão remotas quanto as disputas tribais.

- A gente fica com raiva! Muita raiva! Daí a gente quebra tudo! Faz rebelião e quebra a porra toda! Quebra mermo!!!
- Mas daí a policia chega e desce a porrada em vocies…
- Ah! Mas porrada a esta altura é massagem…

Você têm uma casa, família, Internet e pelo menos um segundo grau completo e não precisa ter passado por muito perrengue pra se revoltar, basta assistir as notícias com um minimo de senso critico ligado. Agora se você passa pelo que esses moleques passaram, você não tem muita alternativa de qualquer maneira. Acontece que essa galera não sabe nada sobre Che Guevara, Baader-Meinhoff, Carlos Chacal, os Feddayen e os homem-bomba, eles só tem o conhecimento de que podem muito fácil e muito rápido engajar-se numa vida de aventura e suicidio. A diretoria, por trás do sorriso hipócrita escondia o nojo e a sensação repugnante de poder estar de frente ao Elias Maluco ou Beira-Mar de amanhã, enquanto eu e alguns poucos tinhamos a certeza de que através do Hip Hop a gente possa tranformar alguns desses num Afro-X ou até num Thayde de amanhã. Bastava um pouco de empenho e aceitação. Sei lá, mas é que se não fosse por essas merdas tribais, a gente podia focalizar aquela raiva toda pro inimigo comum e real, a nova ordem mundial que quer transformar o mundo na utopia da classe média, onde toda a produção é voltada pro consumo e os indesejáveis são jogados no saco. Já estive em presídios e notei o poder de penetração e dominação das Igrejas, tão malignas e gananciosas quanto as facções. Ali não tinha religião, provavelmente porque menores não são bom negócio, então se a gente conseguisse pregar com os quatro elementos lá dentro, talvez daqui a uns anos tivessemos mais gente no microfone e menos no fuzil. Porque Hip Hop não é só o Rap de merda que você dança no fim de semana, é poesia, música, expressão corporal e visual. É sampleando o D2 “a sabedoria de quem não precisa resolver mais no tiro”.

Dai desmontamos o equipamento e voltamos pra Zona Sul. No carro o Angolano contava que na sua terra o pessoal via nas novelas um Brasil maravilhoso, onde não existiam problemas e todos os negros eram chiques e respeitados. E quando ele chegou aqui, assustou-se com as favelas, que ele diz não existir na Africa, mesmo com toda a miséria que dizem a respeito da Africa. Porque lá é um lugar onde o homem vive muito mais em paz com a natureza. Seu discurso era lindo porém as vezes sua religiosidade esbarrava em alguns dos meus ideais anarquistas, mas eu não queria discutir, estava interessado no papo e ainda pensativo na experiência com os menores.

Naquele curto período no meio da molecada fui sobrecarregado de narrativas e experiências que agora tanto me empolgavam como despertavam um sentimento de culpa burguês, aquele mico de quem visita o zoológico. Como naqueles vários contos do John Reed onde ele ou outros intelectualoides pagavam bebidas a putas, mendigos ou bandoleiros em troca de inspirações e o sedutor contato com a marginalidade. Imagino que aqui no Brasil ele levaria várias voltas, visto que não precisa ir muito longe pra ter esses contatos, apenas o signos certos pra conseguir neutralidade, e ouvidos para captar o que esses tipos gostam de falar. Porque aqui, quando você sai sozinho a noite nunca sabe se vai cruzar com uns playboyzitos fascistas com inveja de tua vida loka e pau grande, se vai levar uma geral e canelada da polícia ou assaltado por um cheirador qualquer. Me fez lembrar do episódio do intervalo do Brasil e Alemanha quando fui fazer fumaça na beira da praia de copacabana, onde assistia o jogo num telão cercado de câmeras, gringos, banhistas e meliantes. O sol rachava meu coco quando um sujeito de calça jeans e sem camisa muito marcado pela vida se aproximou pedindo uma bola.

- Vim de Cabo Frio…
- Lá é bom… Altas praias…
- Pois é… Mas Tive de ralar de lá rapá! Os caras queriam me pegar!
- Os canas!?
- Não… uns filhadaputa lá…
- Que merda…
- Agora eu moro aqui, nóis tudo dorme na praia…
- Ah!
- Não é fácil não… Aqui no Rio não é fácil pra ninguém… A gente passa fome! Necessidade! Os gringo vêm aqui denoite… perde mermo!

Hmmm… O papo tava começando a ficar pesado, e eu não precisava de toda essa negatividade, não com o Brasil prestes a ser campeão, quando eu já ia desviar o papo para algum debate fútil corrente como “Rivaldo ou Ronaldo?” somos interrompidos por três “amigos” de cabelo descolorido, jóias grandes e indumentária vermelha.

- doizinho aê sanguebão!
- O beque é dele!
- Fiquem a vontade…

O papo tinha tudo pra piorar, mas bandido safo é bandido quieto e os caras partiram depois de uma rodada sem dar um pio, só saudando.

- Fé em Deus!
- Valeu! É nóis!

Dai o outro recomeça….

- Então… Eu tou só dando um tempo…
- Pra que!?
- Eu não aguento aqui não cara!! Passando fome!!! Lá em Cabo Frio eu tenho casa!!! Aqui nada!
- …
- Eu tou só dando um tempo… Eu vou descolar uma arma e voltar lá, matar todos aqueles filhosdaputa e voltar a ser um cara tranquilo. Lá é o meu lugar!!!
- Porra… derepente o Rivaldo faz dois gols e é o artilheiro da copa… Já pensou!?

O Rio é assim… Um jornalista disse que se o Rio ficou assim é culpa de todas as pessoas que consumiram alguma droga nos últimos trinta anos, e que todos nós matamos Tim Lopes. Eu ainda acho que foi o “mole” ou a “função” de ter ficado muito visado, porque sabia-se que é um jogo arriscado, e sabe-se muito bem as regras do jogo no que se diz a respeito de caguetagem. É uma lástima ver toda essa garra iludida por gangues sanguinárias numa luta ilegitima dessas, é triste ver tanta violência empregada sem razão. A gente fica puto quandoos caras fingem se impressionar quando acharam mais de vinte caveiras antes de achar Tim Lopes e tu não acredita como tem playboy que sabe disso tudo e ainda sai de casa cheio de marra pedindo pra levar um tiro.

Chegamos na MTV, e a garra venceu o sono e dissemenei o Terrorismo Editorial no microfone, mandando declaração de amor para diretora de programa, detonando a mídia corporativa e levantando a bandeira dos indenpendentes ao narrar a história das inúmeras vezes em que ignorado pelas assessorias de imprensa e produção tive de armar “esquemas” para cobrir eventos e mais tarde quando publiquei o trabalho as mesmas pessoas que me ignoram vem babar o ovo.

- Nossa! Adorei! Como você conseguiu?

É um planeta estranho o nosso. E eu falava feito um Fidel Castro empolgado pelos sorrisos da atenciosa platéia de colegas de profissão que muitas vezes me viram em ação (e embarcaram na vibe). Acima de tudo o que tentava dizer na matéria é que “televisão eu também faço!” ainda mais nesta onda atual de reality shows e casa dos artistas… Mas acabei me enrolando demais na onda do Dogma, o 95 e o 1,99. Alguém por aqui viu o heróico Fucklands!? E “os Idiotas Mesmo”? Bem… São referências dos respectivos gêneros.

A matéria deve ir ao ar na semana do dia 15/8 no Drops-Rio da MTV, lamentavelmente só vai passar a matéria no Rio. Mas a Tarja Preta tá aí disseminando-se feito vírus. O terrorismo editorial já foi feito! Imagina no dia em que só os malucos povoarem a terra!? Testemunhando aquela vivência que é melhor que qualquer ficção ou jornalismo, contruindo a história das próximas gerações, sem medo de nada. Saindo de lá, fomos a pé até o final de copacabana, enfrentando uma tempestade de areia no calçadão e cruzando dentre as várias figuras, com uma coroa de shortinho que deixava de fora a vasta enorme bunda de textura similar ao maracujá.

- Deus do céu – blasfemiava um malandro transneunte.

Chegamos no bacanissímo apê de Gabriel Thomaz onde nos divertimos pelas horas seguintes fuçando sua vasta coleção de LPs e Compactos em vinil. Com inúmeras raridades e bizarrices de todo gênero. Galera… Esse video vai ter o sabor…

Uns no som, uns no video e outros na fita. O que faz os heróis não é só a origem humilde como o ciclo todo. É trabalhar pra melhorar e fazer a história, não acredito em competição mas quero ver todo mundo se esforçando pra elevar as coisas a outro nível. Outro dia eu estava na area do empório, posto nove, berço da supostamente transgressora juventude transviada (e maconheira) carioca. Estava fazendo o que era pra se fazer, quando um bonde de cinco desses pit-boys, desses que se se comem em frente ao espelhos das academias, tomaram e esfarelando nosso baseado, achando estar fazendo uma ação de cidadania ao tomar as dores da polícia. É triste ver a que ponto de mediocridade essa gente chega se fascitizando por falta de opção. Todo mundo achou que a coisa a se fazer era fugir… dar o fora no sapatinho, mas como Matias Maxx não abaixa a cabeça pra Playboy invejoso ficou á parado, desafiando como um Tyler Duren espancado pra cativar a platéia. Mas como esperado, os playboys eram covardes demais pra brigar, mas a platéia, de metaleiros, alternativos, ravers, clubbers e “alternativos” do posto nove nada mais fez do que se assustar, ao invés de tomar alguma posição.

No final das contas, o debíl mental só conseguiu me dar um soquinho de merda. Quase que na testa que eu facilmente bloquiei. Dai em seguida, como que ensaiado, um amigo o segurou.

- Fica calmo Gracie!!

Era obvio que o cara não ia tentar bater mais. Esses caras que só andam em mulão, geralmente nunca apanharam na vida e não sabem brigar for a do tatame. Sabem provocar mas não tem iniciativa nem desenvultura numa briga de verdade. Que pena que tava em maioria e tudo que eu podia fazer era jogar com as palavras e animar o circo.

- Você acha que eu tenho medo de playboy!?

Nos afastamos…Muito puto, como é que alguém pode assistir Jornal Nacional e sair com essa marra toda na rua!? Provavelmente nunca apanhou na vida, mas você engana as pessoas as vezes, mas não dá pra enganá-las o tempo todo. Então ele é Gracie!? Ou é apenas um apelido de academia!? O último Gracie cheio de marra acabou estirado em frente a uma boate com um tiro no peito… Deu notícia.