8.11.02

HUSTLE HUSTLER

Chegou o horário de verão, o que quer dizer que tenho mais uma hora de dia, visto que quando não tem mais nada de interessante pra fazer de manhã (como trabalho ou cabine de cinema) eu acordo pra lá de meio dia. Mas venho aproveitando esta escaldante primavera pra pegar um grau lá no nove na companhia de minhas deliciosas amigas modelos e apresentadoras de TV. Mas as coisas nem sempre ocorrem como a gente quer, e quando faz sol você tá trabalhando e na semana em que você tá de bobeira e resolve se largar na praia de segunda a quinta (tu acha que eu sou maluco de ir na praia no finde?) chega na terça e começa a chover, mas pelo menos eu não ia ficar de bobeira, visto que tinha um trampo pra fazer.

A Rebecca do Greenpeace e o Ricardo Oll Dog estavam de passagem no Rio, trazendo consigo a chuva e a missão de colher uns depoimentos em vídeo de celebridades para sua campanha contra a extração ilegal do Mogno e eu ia fazer os stills. O Mogno ao que parece é uma árvore ameaçada de extinção cuja madeira valiosissíma movimenta um esquema cavernoso de tráfico. Parece que os próprios indios cortam a porra das árvores seculares e as vendem por tipo oitenta dólares e elas saem do país clandestinamente via Belém a uns U$1500. Os móveis são vendidos na europa por uma fortuna surreal. Além de não pagar imposto algum esse tráfico degrada legal nosso ecossistema, e tudo isso só acontece porque não tem uma fiscalização decente na amazônia e fronteiras. E todo mundo sabe que onde passa madeira, passa brizola, heroína, ak-47, Farcs e o escambau. Maconha não, maconha neguinho planta em qualquer armário com uma lâmpada!

Encontrei com a galera no apê da Camila Pitanga no Leblon. Muito simpática ofereceu o mate natural que ela mesmo fez.

- Muito melhor que o de copinho… eu que fiz!!
- Só! O de copinho além de ser cheio de química ainda vem dentro de um plástico!
- Pois é! Não tinha pensado nisso…
- Veja só… eu vou no nove direto… lá o pessoal tira mó onda com suas tatuagens e pose de “geração saúde”. Mas porra!!! O copinho de todo mate e guaraplus que esses filhos da puta bebem acaba na areia… Lamentável! Estraga toda a pose que essa “juventude” quer ter… eu pelo menos sou junkie assumido e bebo cerveja… e latinha tá cheio de vagabundo querendo catar… as vezes o próprio cara que te vende fica enchendo o saco de dez em dez minutos pra ver se tu já terminou…

Eu ia agradecer pelo Mate dizendo que tava tão delicioso quanto ela, mas uma voz dentro de minha cabeça me freou: “Segura a onda! Vai ter outra chance!”.
Vestimos a menina com a camiseta da campanha e começamos a entrevista. Tão simpática quanto indignada queria saber porque que a gente não usava o SIVAM pra controlar esse e outros tráficos (afinal não é isso pra que ele serve?). O sorriso dela me enfeitiçou tanto que nem lembro direito da entrevista, sei que ela disse que queria conhecer a amazônia, que todo mundo devia pressionar o governo para preservar o que para muitos cariocas como ela parece um paraíso distante, mas que tá ameaçado.

De lá voltamos pra Botafogo Valley onde encontramos o Seu Jorge num estúdio fotográfico, ele vestia uma camiseta com a ultrasonografia de sua filha estampada – Olha só! Já dá pra ver o narizinho achatado – dizia a mãe, feliz com seu barrigão. O Seu Jorge eu sempre esbarrei nas noitadas, tipo na época em que eu começei a fotografar, a época do Farofa Carioca que surgiu como um negócio bem legal, misturava os ritmos que faziam a cabeça dos verões maconheiros do rio de janeiro com uma levada pop. O grande pecado foi embarcar com outros grupos numa viagem erradíssima de chamar o antes indiscrítivel som de MPC (Música Popular Carioca), rótulo tão sem vergonha quanto pretencioso, pra completar o disco que gravaram não era tão bom quanto os shows. Não demorou pra começar a incomodar, não a música, mas o que ela representava, daí pra gravadora jogar no congelador foi um passo. O triste destino de toda banda que não consegue seus cem mil de cara.

Eu já me diverti bastante em alguns shows do farofa (teve uns no horto junto com a bateria da mangueira em pleno carnaval que foram foda!) e sempre admirei a voz do Seu Jorge mas como já disse não curtia o que ela representava. Aquele pessoal da PUC travestido de hippie dizendo que “preto é lindo” e sacaneando a empregada. Não levava fé no cara por conta dessa história de MPC até conhecê-lo legal viajando para Belo Horizonte com o MD2 e Funk Fuckers. Foi uma viagem de ônibus, bem naquela astral “rock’n’roll is coming to town”, peguei o ônibus com os Funk Fuckers lá no estúdio Casa 3 em copacabana e fomos buscar o bonde do Marcelo na Zona Norte, eles tinham acabado de abrir um show pro Bezerra da Silva e tava todo mundo muito louco trazendo vários brindes do camarim. Quantas horas são até Belo Horizonte!? Eu não sei! A gente deve ter demorado o dobro de tantas vezes que paramos pra fazer refill no estoque de cervejas. Bandejas e cigarros suspeitos passeavam pelo ônibus que além do pessoal das bandas trazia um uns bicões como o Formigão, um mano que até hoje não sei o nome, o Seu Jorge e Matias Maxx, lógico. O Seu Jorge fazia uma participação no show do Marcelo, tocando um sambinha no violão, e foi o primeiro a perceber, de manhã, quando todo mundo tava tentando dormir que chegamos em BH, tratando de acordar todo mundo gritando – vamos abrir a loja! Vamos abrir a loja!

Na volta, sentei do lado do cara que veio tocando vários sambas obscuros que pareciam até Funks Proibidos e rimos bastante. Mudei totalmente minha opinião a respeito dele que um par de anos depois lançou seu disco solo no Humaitá Pra Peixe, nessa ocasião eu tava preparando um fanzine pro festival e fui entrevistá-lo junto com uma amiga que tava tocando o caô comigo. Ele tava morando numa cobertura no Flamengo, de frente pro morro azul e logo de cara colocou pra gente “Garota Zona Sul” da Jovelina Pérola Negra que ele apresentou como tia sua.

“Ai que vontade que eu tinha de ter um carango joinha,
e morar na Vieria Souto… Ou em copacabana!
Só de motocicleta Honda e muita grana…”

Fiz umas fotos dele largadão numa cadeirinha de praia na cobertura enquanto o entrevistávamos entupindo-nos cerveja. Assim que a entrevista e a cerveja acabou ele pediu pra que eu descesse pra comprar mais, falou isso com uma cara de safado singular, afinal a mina com quem ele ia ficar a sós por alguns minutos não era de se jogar fora. No final das contas acabei descendo umas duas vezes mais e ficamos bebendo noite adentro, até uma dessas apresentadoras de TV tocar a campainha pra uma visitinha surpresa. Tá bom… Por essas e outras que deu a maior felicidade ver o cara de cabelo dessarumado empunhando um fuzil na pele do bandido-mocinho Mané Galinha no campeão de bilheteria “Cidade de Deus”.

Hustle Hustle Hustle Hustle…

O depoimento do cara a respeito do mogno foi legal. Ele olhava e apontava pra câmera com a autoridade das ruas cobrando do governo a tutela da região e comparava os biopiratas ao beira-mar. O cara diz que seu trabalho solo é puro Bebeto, que eu desconheço, mas identifico o Jorge Ben. Pretinha… Pretinha…

Hoje vou ver o Planet Hemp, uma das poucas bandas boas desse país que consegiu o respeito de cara e moral na gravadora. Não fazem tantos shows quanto essas outras bandas que tão na TV, até porque pelo papo e trilha deles neguinho não deixa e também não tem tantos discos. Mas também não tem discos ruins e faz parte da história de uma cidade e da música de um país. Diferente do que muita gente idolatra por aí certo de que vai se envergonhar daqui a uns vinte anos…

Pena que o show é na Barra.

Ah! Mas o que importa é que eu fiquei com uma foto da Camila que eu mostro pros amigos que vem aqui em casa dizendo que “é minha nova mina”.
E alguns manés caem!

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