17.6.02

EM NATAL
COMA AS POTIGUARES

(Uma cobertura insólita do MADA)


Parte III – Nem todo camarão é de fumar!

Foi nesse dia em que perdemos o café vendo o jogo do Brasil sem conseguir movernos da cama!? Sei lá, eu sei que estávamos de mão cheia e tinhamos armado de pegar um praião e comer um peixe. Fizemos contato com os nativos e marcamos um encontro na ponta negra, a praia badalada, a ipanema de lá. Com calçadão, concreto, quiosques e restaurantes bacanas. Tava sol pra caralho e resolvemos esperar nosso broder na sombra de um daqueles restaurantes. Eu pedi uma cerveja e o tomate refrigerante e pastéis de camarão pra beliscar, logo o broder chegou de latinha na mão e ficamos jogando papo fora, sempre interrompido por pedintes, vendedores de óculos e artesanatos toscos. Meninas de short justo e camisetas promocionais passaram distribuindo tabelinhas da copa patrocinadas por um curso de inglês. Nelas a argentina aparecia como favorita e a frança no primeiro lugar do ranking… Quem seria o figura que escreveu isso!? Caralho, já bastava naquela manhã (ou na anterior, ou na seguinte… as memórias são confusas) termos encarado um especial da SporTV sobre a copa, na qual jornalistas de diversas nacionalidades (a maioria européia e africana) diziam suas opiniões sobre a copa. As cagações de regra acerca a França ser a equipe mais bem preparada eram intercaladas por depoimentos de Zidane e outros jogadores do gueto. Até jornalistas de países colonizados (massacrados) como o Haiti pelavam a equipe francesa… Que voltou da copa sem gol nenhum… Não dava pra entender.

A Argentina também voltou pra casa. O que não é de todo ruim, pois se o país vem ardendo há meses agora é que não há mais ópio algum pra recorrer. Enquanto isso no Brasil, com vitória ou não o povo só vai continuar reclamando é da temperatura da cerveja…

De pele rubra, decidimos que expornos ao cancerígeno sol daquela hora do dia seria loucura. Já bastava a sexta-feira. Decidimos que a boa coisa a fazer era prepara-mos prum rango e fazer hora pra depois dar um rolé em algum praião. Entramos no escaldante carro e rumamos para um cantinho pitoresco não muito longe dali, uma rua que dava pra uma igrejinha no sossegado clima de vilarejo de pescadores. A peixaria era colada numa vendinha e tinha um bando de pescadores largados por lá. Compramos camarão pra caralho e um peixe gigante. Não entendo porra nenhuma de comida do mar, sempre evitei qualquer porcaria que venha das aguas lamentavelmente imundas que nos rodeiam até descobrir que sushi a quilo no almoço era a melhor coisa para manter uma boa dieta e valorizar os tickets refeição dentro de uma vida corporativa. Mas nordeste é outra história, a agua é quentinha e não têm vala negra na praia. Pelo menos não tão descaradamente, dai rumamos pra casa do broder na sauna móvel.

Mas antes fizemos um contato.

Um velho pescador, desses com a barba mal feita esbranquiçada e as mãos talhadas de anos de trabalho aproximou-nos num tom de simpatia, sabedoria e um charme de doidão.

- Depois dos Beatles! Os melhores são os Bee Gees!!!
- Como é que é!? Os Bee Gees!?
- É! Depois dos Beatles! Os Bee Gess são os melhores do mundo!!

O cara falava "bitús" e "bídíz” e já de dentro do carro afirmamos – ah! Sim! Mas só depois dos Beatles né!?

- É! Só depois dos Beatles! Mas o George Harrisson morreu, e o John Lenon mataram ele né? Em frente ao edifício Dakota né!?
- Então só os Bee-Gees!!!
- É isso aí! Que os Bee-Gees estejam com vocês!!!

E assim se despidiu, com um sorriso angelical e o sinal de OK nas duas mãos, desejando-nos tudo de bom. Saímos de lá abençoados.

Catamos outro broder no caminho da casa estilosa do nosso contato em Natal, onde rindo muito começaram as atividades. Os nativos cortavam o alho e o gengibre, enquanto eu e o Tomate bebiamos cerveja rindo pra caralho com a dona de casa. Depois nos dirigimos a psicodélica varanda onde colocamos a churrasqueira – uma roda de carro adaptada sobre quatro pés de metal e com uma grelha móvel emcima. Que usamos para fritar o camarão junto com o gengibre e alho. Puta que pariu que que ela aquilo!? Arrancar a cabeça do bicho, e comer o resto, com casca, rabo e tudo. Ocasionalmente furando o lábio mas sempre chupando os dedos. Puta que pariu. O peixe foi grelhado com um tempero sagaz com coentro e uma pá de outras coisas. Carne pra caralho, branca, macia e sem espinhas. O almoço durou horas, temperado por muita Skol de garrafa, bombas e MAMBOS!

Ultimamente, desde minhas últimas bebedeiras exageradas tenho cada vez mais encarado a cerveja, especificamente a enlatada e vendida nem sempre gelada, como um veneno químico asqueroso. Não parece mais uma bebida, um troço de certa forma natural. Parece um refrigerante alcóolico feito pra te empapuçar, embriagar e viciar. A de garrafa, que por aqui tu só descola a preços escrotos nos tão bacanas botecos de rua, já disfarça mais, é mais gostosa, outra alternativa é o chopp, mas dai tem que ser em copos grandes e com bastante espuma de preferência cremosa… Naquela ocasião subi e desci as escadas várias vezes atrás de mais garrafas…

Folheavamos albuns de fotos que narravam aventuras num rolé de barco de Natal à Fernando de Noronha e contamos muita história entre uma e outra alusão ao show do caralho que o Jorge Ben daria aquela noite. É claro que desistimos de emendar num praião…

Voltamos pro hotel, onde morgamos por algumas horas antes de partirmos pro festival, dirigindo-nos direto à “sala de imprensa”, um restaurante no cantinho do festival bem distante da “ação” onde a galera ficava rangando, biritando e com alguma sorte, pendurando a despesa na conta do festival. Onde vocês estavam ontem!? E o maluco do Carbura!? Os caras dessa gravadora não entendem porra nenhuma! Esse sujeitinho é um filho da puta mermo!!! Será que dá pra descolar ópio em São Paulo!?

Assisti Jorge Ben do palco, da platéia, do palanque, na área da grua… Naquela época da vida em que você ainda é muito revoltado, conhece muita pouca coisa e fica puto com a mesmice do rádio (bem, isso ainda é assim…) eu não tinha muita paciência pra W/Brasil ou País Tropical. Fui conhecer o Jorge Ben pra valer mais tarde, graças ao Chico Science, ao Rappa, aos Racionais e tantos outros. Pirei, catei discos e informações, mas nunca conferi um show. Sempre soava feito um programa play-farofeiro e não o loki-mulambo que tanto curtimos. Dai que eu precisei ir pra Natal pra ver o Jorge Ben.

O clima pode ter sido de micareta, com luzes voltadas pra platéia que balançava as mãos ao ar em cada “tê-terê-tê-tê” ou naquela música do anúncio da seleção da Nike passando mal... Mas ainda era o Jorge Ben, cantando e tocando pra caralho aqueles temas horrorshow que te fazem sambar feliz da vida ou te tocam, arrepiando cada pelinho de teu plote.

Armas de fogo
meu corpo não alcançarão
Facas e espadas se quebrem
sem o meu corpo tocar.
Cordas e correntes arrebentem
sem o meu corpo amarrar.

Pois eu estou vestido
com as roupas e as armas de Jorge

Solta o pavão… Momentos de plenitude onde pela extensão de um solo ou uma jam você entra num transe em que derepente o universo faz muito mais sentido e você compreende o rumo a ser tomado...

Na volta pro hotel é que fudeu o barraco. Tava aquela euforia, todo mundo com a sensação de dever comprido e ainda estonteados pelo show do Jorge Ben. No dia seguinte, todo mundo pegaria um avião por volta das três da tarde de um domingo com cara de segunda-feira, de volta pra agonizante rotina de todo dia. Estava amanhecendo, era a desculpa que todo mundo precisava para ir pra piscina beber as ultimas latas de cerveja.

Como de costume, o Tomate foi chapar no quarto e eu voltei pra piscina pra pagar mico pelos dois. Foi entre uma geladissima cerveja e outra enquanto falávamos merda e uns e outros se davam bem que eu tive a idéia de recorrer ao potinho de filme onde tinha juntado todas as pontas desde o primeiro dia do festival e apertar um slim.

Não lembro se cheguei a passar adiante, sei que no segundo pega as coisas começaram a escurecer…

Nenhum comentário: